domingo, 28 de novembro de 2010

GUERRA DO RIO - UMA ANÁLISE A SER CONSIDERADA.

A Guerra do Rio – A farsa e a geopolítica do crime
José Cláudio Souza Alves
Seropédica, 25/11/2010
José Cláudio de Souza Alves é sociólogo, com doutorado na USP, professor da Universidade Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, RJ, autor do livro "Dos Barões ao Extermínio – Uma História da Violência na Baixada Fluminense"
Nós que sabemos que o “inimigo é outro”, na expressão padilhesca, não podemos acreditar na farsa que a mídia e a estrutura de poder dominante no Rio querem nos empurrar.
Achar que as várias operações criminosas que vem se abatendo sobre a Região Metropolitana nos últimos dias, fazem parte de uma guerra entre o bem, representado pelas forças publicas de segurança, e o mal, personificado pelos traficantes, é ignorar que nem mesmo a ficção do Tropa de Elite 2 consegue sustentar tal versão.
O processo de reconfiguração da geopolítica do crime no Rio de Janeiro vem ocorrendo nos últimos 5 anos.
De um lado Milícias, aliadas a uma das facções criminosas, do outro a facção criminosa que agora reage à perda da hegemonia.
Exemplifico. Em Vigário Geral a polícia sempre atuou matando membros de uma facção criminosa e, assim, favorecendo a invasão da facção rival de Parada de Lucas. Há 4 anos, o mesmo processo se deu. Unificadas, as duas favelas se pacificaram pela ausência de disputas. Posteriormente, o líder da facção hegemônica foi assassinado pela Milícia. Hoje, a Milícia aluga as duas favelas para a facção criminosa hegemônica.
Processos semelhantes a estes foram ocorrendo em várias favelas. Sabemos que as milícias não interromperam o tráfico de drogas, apenas o incluíram na listas dos seus negócios juntamente com gato net, transporte clandestino, distribuição de terras, venda de bujões de gás, venda de voto e venda de “segurança”.
Sabemos igualmente que as UPPs não terminaram com o tráfico e sim com os conflitos. O tráfico passa a ser operado por outros grupos: milicianos, facção hegemônica ou mesmo a facção que agora tenta impedir sua derrocada, dependendo dos acordos.
Estes acordos passam por miríades de variáveis: grupos políticos hegemônicos na comunidade, acordos com associações de moradores, voto, montante de dinheiro destinado ao aparado que ocupa militarmente, etc.
Assim, ao invés de imitarmos a população estadunidense que deu apoio às tropas que invadiram o Iraque contra o inimigo Sadan Husein, e depois, viu a farsa da inexistência de nenhum dos motivos que levaram Bush a fazer tal atrocidade, devemos nos perguntar: qual é a verdadeira guerra que está ocorrendo?
Ela é simplesmente uma guerra pela hegemonia no cenário geopolítico do crime na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
As ações ocorrem no eixo ferroviário Central do Brasil e Leopoldina, expressão da compressão de uma das facções criminosas para fora da Zona Sul, que vem sendo saneada, ao menos na imagem, para as Olimpíadas.
Justificar massacres, como o de 2007, nas vésperas dos Jogos Pan Americanos, no complexo do Alemão, no qual ficou comprovada, pelo laudo da equipe da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, a existência de várias execuções sumárias é apenas uma cortina de fumaça que nos faz sustentar uma guerra ao terror em nome de um terror maior ainda, porque oculto e hegemônico.
Ônibus e carros queimados, com pouquíssimas vítimas, são expressões simbólicas do desagrado da facção que perde sua hegemonia buscando um novo acordo, que permita sua sobrevivência, afinal, eles não querem destruir a relação com o mercado que o sustenta.
A farsa da operação de guerra e seus inevitáveis mortos, muitos dos quais sem qualquer envolvimento com os blocos que disputam a hegemonia do crime no tabuleiro geopolítico do Grande Rio, serve apenas para nos fazer acreditar que ausência de conflitos é igual à paz e ausência de crime, sem perceber que a hegemonização do crime pela aliança de grupos criminosos, muitos diretamente envolvidos com o aparato policial, como a CPI das Milícias provou, perpetua nossa eterna desgraça: a de acreditar que o mal são os outros.
Deixamos de fazer assim as velhas e relevantes perguntas: qual é a atual política de segurança do Rio de Janeiro que convive com milicianos, facções criminosas hegemônicas e área pacificadas que permanecem operando o crime? Quem são os nomes por trás de toda esta cortina de fumaça, que faturam alto com bilhões gerados pelo tráfico, roubo, outras formas de crime, controles milicianos de áreas, venda de votos e pacificações para as Olimpíadas? Quem está por trás da produção midiática, suportando as tropas da execução sumária de pobres em favelas distantes da Zona Sul? Até quando seremos tratados como estadunidenses suportando a tropa do bem na farsa de uma guerra, na qual já estamos há tanto tempo, que nos faz esquecer que ela tem outra finalidade e não a hegemonia no controle do mercado do crime no Rio de Janeiro?
Mas não se preocupem, quando restar o Iraque arrasado sempre surgirá o mercado financeiro, as empreiteiras e os grupos imobiliários a vender condomínios seguros nos Portos Maravilha da cidade.
Sempre sobrará a massa arrebanhada pela lógica da guerra ao terror, reduzida a baixos níveis de escolaridade e de renda que, somadas à classe média em desespero, elegerão seus algozes e o aplaudirão no desfile de 7 de setembro, quando o caveirão e o Bope passarem.
COMENTO:
Uma opinião que deve ser analisada com atenção.
Faça uma breve incursão no blog "Banda Podre: A Máfia das Polícias (leia), você poderá encontrar alguns temas (links) interessantes, para continuar juntando as suas peças.
As conclusões devem ser suas e não da mídia.
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
Ex-CORREGEDOR INTERNO

5 comentários:

Anônimo disse...

É evidente que os responsáveis pela criminalidade visível devem ser presos pela PM, pois sofrem as classes média e pobre e é o que o policiamento ostensivo pode fazer. Mas a mídia não comenta nem cobra dos verdadeiros responsáveis por grande parte do problema, legislativo, judiciário e autoridades do executivo. Um dos fulaninhos presos tinha 15 passagens pela polícia, dentre as quais por roubo e homicídio. Isso significa que a PM já tinha feito o seu dever de casa mas, devido a verdadeiros criminosos irresponsáveis, o cara estava solto por ter fugido após um indulto qualquer. Com tantos crimes cometidos era de se esperar que a polícia judiciária estivesse trabalhando nos inquéritos anteriores e não na pista disputando lugar com o policiamento ostensivo; que o judiciário já tivesse condenado irrecorrivelmente tal sujeito; que o legislativo já tivesse produzido os instrumentos necessários a alijar da sociedade o fulaninho e, finalmente, que o executivo construísse as cadeias suficientes ao invés de jogar pra plateia.

Alexandre, The Great disse...

Um sociólogo, mesmo Doutorado pela USP, não é propriamente um "especialista em segurança pública", ou pior, é tanto quanto um Rodrigo Pimentel, uma Julita Lemgruber e por aí vai.
Porém ele tem a sua opinião, válida tão somente como tal, contudo não o suficiente para pautar prognósticos sobre a Segurança Pública do RJ.

Paulo Ricardo Paúl disse...

Grato pelos comentários.
Opiniões, certas ou erradas, devem ser consideradas.
Juntos Somos Fortes!

Anônimo disse...

Achei a opinião muito carregada com a teoria da conspiração e pouco elucidativa sobre soluções. Qual seria a resposta correta? uma tomada de poder? uma ditadura? Ações de pacificação são necessárias, todavia mais do que isto é necessário educação e valorização familiar, coisas que não vendem jornal e nem são objetos de busca do google. Desta forma, ações como as do complexo do alemão são ainda úteis e devem ser valorizadas.

Paulo Ricardo Paúl disse...

Povo sem educação é povo sem cidadania.
Juntos Somos Fortes!