O poder sempre teve a preocupação de controlar o seu exército – a força – utilizando as mais variadas maneiras para conseguir esse objetivo ao longo do tempo, sendo que algumas delas persistem até os nossos dias.
Um exército insatisfeito sempre foi uma grande ameaça ao poder político e não foram poucas as vezes que a força subjulgou os políticos, unindo poder e força, o que normalmente desencadeava em regimes autoritários.
Mas antes de comentarmos os artifícios utilizados pelos governantes e por alguns comandos para dominar a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, precisamos abordar um tema que já tratamos algumas vezes nesse espaço democrático: a relação dos crimes de rua com as Polícias.
Nós já escrevemos que o Policial precisa ganhar muito mal para que possa ser corrompido por migalhas, permitindo o “trabalho” livre dos criminosos de rua e a consequente arrecadação de fortunas.
Cidadão, imagine se um Policial desonesto exigisse de cada kombi ou van utilizada no transporte alternativo clandestino, a importância de R$ 100,00 por dia de circulação. Isso inviabilizaria esse transporte alternativo que não arrecadaria para pagar as propinas a todos os Policiais de cada área onde circulasse. Igual raciocínio podemos desenvolver com relação aos milhares de pontos do jogo dos bichos espalhados por todo o Rio de Janeiro. O bicho quebraria.
Diante dessa realidade, o fato do Policial Militar receber menos de R$ 30,00 por dia facilita que os Policiais que estão predispostos a aceitar a corrupção, o façam por poucos reais. Policiais já foram autuados por receberem R$ 2,00 de uma kombi do transporte alternativo, apenas para citar um exemplo.
Portanto, para que o crime de rua possa prosperar o Policial tem que ganhar muito mal, isso é uma verdade.
Mas como manter sob controle todo um “exército” que ganhe muito mal para facilitar a cooptação de uma parte dele pelos corruptos?
Essa é a grande questão, harmonizar formas de controle, que sejam eficientes para alcançar os honestos e os desonestos.
Isso posto, vamos voltar as maneiras de controlar a força.
Uma delas é a aplicação rigorosa dos regulamentos militares com penas rigorosas, inclusive com a pena de morte, que foi muito empregada ao longo da história. Assim o medo passava a ser a forma de manter a tropa quieta, sem reclamar das vicissitudes, que ainda tinha o direito de ficar com o espólio dos vencidos.
A pena de morte ficou no passado da história.
Na Polícia Militar essa fórmula rígida de aplicação dos regulamentos disciplinares chegou a ser empregada apenas por alguns comandantes de unidades, que ficaram conhecidos por terem a “mão pesada”, porém nunca foi uma política de comando, o que acabou provocando que cada batalhão fosse uma Polícia, um retrato do seu comandante.
Nos nossos tristes dias, essa fórmula praticamente em desuso, pois descobriu-se que a flexibilização nos regulamentos era um importante componente para implementar uma outra forma de controlar a tropa.
A outra forma na verdade é uma maneira criminosa, um “fechar de olhos” omissivo, combinado com uma melhoria na escala, alcançando desonestos e honestos.
E para explicá-la recorro a uma frase do meu amigo Tenente Coronel Carlos Henrique.
Henrique era Major e trabalhávamos na 1ª DPJM, um dia após uma autuação, ele comentou que alguns comandantes pareciam utilizar uma frase como regra de comando:
- “Enquanto não der “merda” eu seguro!”
Essa frase significava que o comando não ficava fiscalizando a tropa, que poderia agir livremente na busca de propinas, todavia, caso alguém fosse flagrado no cometimento de alguma irregularidade, o comando não seguraria e adotaria as providências cabíveis.
Essa regra tácita faz sempre um grande sucesso.
Agindo assim comandos satisfaziam aqueles que tinham a predisposição para aceitar os subornos, para celebrar os acordos baseados na corrupção ativa e passiva, uma ligação simbiótica.
Porém, como controlar os Policiais Militares honestos?
Uma grande parcela da Polícia Militar é composta por Policiais Militares que não aceitam qualquer recebimento ilegal, o que significa que para controlá-los os comandos precisavam descobrir uma nova fórmula e ela surgiu com o aumento dos períodos entre os serviços.
Assim surgiram as escalas equivalentes ao 24 x 72 horas da Polícia Civil e o dia sim, dia não, para os que trabalham no expediente.
Isso permitiu que os autênticos Policiais Militares pudessem trabalhar no segundo emprego – bico – nas suas folgas, melhorando as condições de vida de seus familiares e acalmando essa significativa parcela da tropa, que passou a temer perder a escala mais flexível.
A terceira maneira é muito conhecida, dividir para enfraquecer.
O poder político emprega esse modo de controle distribuindo gratificações e benefícios para alguns, que ficam satisfeitos por receberem beneces que os outros não recebem e ficam quietos em seus “cantinhos” temendo perder esses prêmios.
Sérgio Cabral aumentou algumas gratificações pagas a Coronéis de Polícia de R$ 2.200,00 para R$ 7.500,00 (+ 230%).
Atualmente, alguns Policiais recebem: gratificação do PRONASCI; RioCard; BOPE - R$ 1.000,00; UPP - R$ 500,00 e já anunciam R$ 350,00 para os Policiais que estejam aptos para trabalharem nas ruas.
Eis uma tropa dividida e enfraquecida, como o poder político sempre sonhou.
Diante do exposto, podemos afirmar sem medo de errar que o poder político se utiliza dessas fórmulas para manter a tropa sob controle.
Premia alguns, melhora as escalas e fecha so olhos.
Cidadão, quando você presenciar uma operação feita por dois Policiais, pode estar certo que alguém está fechando os olhos, pois isso contraria frontalmente a técnica.
Igual interpretação você poderá empregar quando perceber viaturas paradas sistematicamente em pontos comerciais.
Obviamente, o funcionamento ostensivo dos pontos do jogo dos bichos, a circulação de veículos de transporte alternativo e as bocas de fumo a todo vapor, significam que muita gente está com a vista turva.
Mudar essa realidade é o nosso dever, cidadão fluminense, caso contrário chegará o dia em que você e seus familiares não poderão mais sair às ruas.
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
Ex-CORREGEDOR INTERNO
Um exército insatisfeito sempre foi uma grande ameaça ao poder político e não foram poucas as vezes que a força subjulgou os políticos, unindo poder e força, o que normalmente desencadeava em regimes autoritários.
Mas antes de comentarmos os artifícios utilizados pelos governantes e por alguns comandos para dominar a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, precisamos abordar um tema que já tratamos algumas vezes nesse espaço democrático: a relação dos crimes de rua com as Polícias.
Nós já escrevemos que o Policial precisa ganhar muito mal para que possa ser corrompido por migalhas, permitindo o “trabalho” livre dos criminosos de rua e a consequente arrecadação de fortunas.
Cidadão, imagine se um Policial desonesto exigisse de cada kombi ou van utilizada no transporte alternativo clandestino, a importância de R$ 100,00 por dia de circulação. Isso inviabilizaria esse transporte alternativo que não arrecadaria para pagar as propinas a todos os Policiais de cada área onde circulasse. Igual raciocínio podemos desenvolver com relação aos milhares de pontos do jogo dos bichos espalhados por todo o Rio de Janeiro. O bicho quebraria.
Diante dessa realidade, o fato do Policial Militar receber menos de R$ 30,00 por dia facilita que os Policiais que estão predispostos a aceitar a corrupção, o façam por poucos reais. Policiais já foram autuados por receberem R$ 2,00 de uma kombi do transporte alternativo, apenas para citar um exemplo.
Portanto, para que o crime de rua possa prosperar o Policial tem que ganhar muito mal, isso é uma verdade.
Mas como manter sob controle todo um “exército” que ganhe muito mal para facilitar a cooptação de uma parte dele pelos corruptos?
Essa é a grande questão, harmonizar formas de controle, que sejam eficientes para alcançar os honestos e os desonestos.
Isso posto, vamos voltar as maneiras de controlar a força.
Uma delas é a aplicação rigorosa dos regulamentos militares com penas rigorosas, inclusive com a pena de morte, que foi muito empregada ao longo da história. Assim o medo passava a ser a forma de manter a tropa quieta, sem reclamar das vicissitudes, que ainda tinha o direito de ficar com o espólio dos vencidos.
A pena de morte ficou no passado da história.
Na Polícia Militar essa fórmula rígida de aplicação dos regulamentos disciplinares chegou a ser empregada apenas por alguns comandantes de unidades, que ficaram conhecidos por terem a “mão pesada”, porém nunca foi uma política de comando, o que acabou provocando que cada batalhão fosse uma Polícia, um retrato do seu comandante.
Nos nossos tristes dias, essa fórmula praticamente em desuso, pois descobriu-se que a flexibilização nos regulamentos era um importante componente para implementar uma outra forma de controlar a tropa.
A outra forma na verdade é uma maneira criminosa, um “fechar de olhos” omissivo, combinado com uma melhoria na escala, alcançando desonestos e honestos.
E para explicá-la recorro a uma frase do meu amigo Tenente Coronel Carlos Henrique.
Henrique era Major e trabalhávamos na 1ª DPJM, um dia após uma autuação, ele comentou que alguns comandantes pareciam utilizar uma frase como regra de comando:
- “Enquanto não der “merda” eu seguro!”
Essa frase significava que o comando não ficava fiscalizando a tropa, que poderia agir livremente na busca de propinas, todavia, caso alguém fosse flagrado no cometimento de alguma irregularidade, o comando não seguraria e adotaria as providências cabíveis.
Essa regra tácita faz sempre um grande sucesso.
Agindo assim comandos satisfaziam aqueles que tinham a predisposição para aceitar os subornos, para celebrar os acordos baseados na corrupção ativa e passiva, uma ligação simbiótica.
Porém, como controlar os Policiais Militares honestos?
Uma grande parcela da Polícia Militar é composta por Policiais Militares que não aceitam qualquer recebimento ilegal, o que significa que para controlá-los os comandos precisavam descobrir uma nova fórmula e ela surgiu com o aumento dos períodos entre os serviços.
Assim surgiram as escalas equivalentes ao 24 x 72 horas da Polícia Civil e o dia sim, dia não, para os que trabalham no expediente.
Isso permitiu que os autênticos Policiais Militares pudessem trabalhar no segundo emprego – bico – nas suas folgas, melhorando as condições de vida de seus familiares e acalmando essa significativa parcela da tropa, que passou a temer perder a escala mais flexível.
A terceira maneira é muito conhecida, dividir para enfraquecer.
O poder político emprega esse modo de controle distribuindo gratificações e benefícios para alguns, que ficam satisfeitos por receberem beneces que os outros não recebem e ficam quietos em seus “cantinhos” temendo perder esses prêmios.
Sérgio Cabral aumentou algumas gratificações pagas a Coronéis de Polícia de R$ 2.200,00 para R$ 7.500,00 (+ 230%).
Atualmente, alguns Policiais recebem: gratificação do PRONASCI; RioCard; BOPE - R$ 1.000,00; UPP - R$ 500,00 e já anunciam R$ 350,00 para os Policiais que estejam aptos para trabalharem nas ruas.
Eis uma tropa dividida e enfraquecida, como o poder político sempre sonhou.
Diante do exposto, podemos afirmar sem medo de errar que o poder político se utiliza dessas fórmulas para manter a tropa sob controle.
Premia alguns, melhora as escalas e fecha so olhos.
Cidadão, quando você presenciar uma operação feita por dois Policiais, pode estar certo que alguém está fechando os olhos, pois isso contraria frontalmente a técnica.
Igual interpretação você poderá empregar quando perceber viaturas paradas sistematicamente em pontos comerciais.
Obviamente, o funcionamento ostensivo dos pontos do jogo dos bichos, a circulação de veículos de transporte alternativo e as bocas de fumo a todo vapor, significam que muita gente está com a vista turva.
Mudar essa realidade é o nosso dever, cidadão fluminense, caso contrário chegará o dia em que você e seus familiares não poderão mais sair às ruas.
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
Ex-CORREGEDOR INTERNO
6 comentários:
Muito cristalino e lúcido tal texto...mas infelizmente a realidade....Pergunta: Qual o porquê de tanta "pressão" sobre a Polícia Militar do RJ pela mídia e sociedade em geral e contraditoriamente poucos "formadores de opinião" se mobilizando a favor de melhor remuneração?
Resposta: acabei de saber o porquê no texto acima.
Conclusão: a sociedade tem em seu estamento superior uma corja de hipócritas!
Grato pelo comentário.
Essa é a principal razão de afirmarmos que o Policial Militar tem que ganhar muito mal.
Isso é uma necessidade "social".
Precisamos lutar contra isso e a PEC 300 é um ótimo começo.
Caro coronel
A situação no CBMERJ não é diferente, temos, hoje, uma tropa dividida em combatentes e o pessoal de enfermagem.
Existem gratificações de todo tipo: motorista da ambulância ganha mais 400,00 , técnico de enfermagem mais 700,00 ( o que faz um CB ganhar mais que um 2º SGT), um médico ganha mais 2100,00 por um serviço de doze horas semanais ( o que faz um tenente ganhar mais que um major), além de outras gratificações, como por exemplo, 686,00 para quem trabalha na dengue.
A ordem é dividir, pois divindo, dividem-se as forças.
SGT BM Renato Neves
Sou praça na PMERJ e concordo com o senhor no BLOG dos Praças atacam o senhor fala que praças tem que votar em praças e eu comentei correto concordo então me indiquem um candidato sem ser envolvido em milicia. Não concordo e jamais vou concordar com algumas supervisões que cobram identidade cobertura e outras bobagens agora aqueles que foram pegos roubando extorquindo carros clonados armas frias e etc... o peso da Lei. Corregedoria forte inteligente e sem vinculos com o CMT Geral ex: o Corregedor for indicação da AJMERJ
Agradecemos os comentários dos leitores.
Sgt Renato, você tem toda a razão, essas gratificações só servem para dividir e para desestimular.
Sem dúvida, o blog dos Praças já cumpriu a sua missão, como ficou claro após a assunção de Mário Sérgio.
A idéia da AJMERJ escolher o Corregedor Interno vai ao encontro da necessidade do Corregedor ser independente do comando da PMERJ.
"Mudar essa realidade é o nosso dever, cidadão fluminense, caso contrário chegará o dia em que você e seus familiares não poderão mais sair às ruas.
"
E quem disse que não chegou?
Quem contou esta mentira? Foi o Pinóquio?
Postar um comentário