quinta-feira, 9 de abril de 2009

SEGURANÇA PÚBLICA DEVE IR ALÉM DA MILITARIZAÇÃO E DA PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO.

Segurança pública deve ir além da militarização e da proteção ao patrimônio.
Segurança deve ser pensada como direito e instrumento de garantia das liberdades; uma política pública deve considerar as desigualdades do país e as diversas formas de violência existentes no Brasil.
As causas da violência no Brasil são inúmeras e refletem a situação de risco e de exclusão da sociedade brasileira, no entanto, é preciso avaliar as especificidades da segurança pública para além das questões da desigualdade social do país. Para José Marcelo Zacchi, advogado, membro do conselho de administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e diretor executivo do Instituto Overmundo, é preciso ir além e “afirmar a segurança pública como um direito e defendê-la como tal”. Esta foi uma das tônicas da manhã de debates do seminário Violência e segurança pública no Brasil: outros olhares, outros rumos, promovido no último dia 18 de março pela ABONG, Ilanud - Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente e Fundação Friedrich Ebert - FES.
O objetivo do encontro foi analisar as diversas perspectivas da questão da violência, procurar alternativas ao modelo atual de enfrentamento e refletir criticamente sobre as políticas de segurança pública. Para isso, o encontro contou com duas mesas de debates: uma para explicitar a relação entre violência e desigualdade, e outra para pensar nos rumos possíveis para uma política nacional de segurança pública.
Thais Zimbwe, jornalista e ativista do movimento negro, da UJIMA - Trabalho Coletivo e Responsabilidade, relatou a experiência do Fórum Nacional de Juventude Negra, apontando que existe uma violência específica para a população negra e pobre. “São mais de 500 anos de exclusão e violência contra a população negra neste país, e em especial contra os jovens. Vivemos um extermínio programado dessa população”, afirmou.
Taciana Gouveia, feminista, da SOS CORPO - Instituto Feminista para a Democracia e integrante da diretoria executiva da ABONG lembrou que há uma comum associação entre a questão da violência e o mundo urbano das cidades. Para ela, é preciso lembrar que no campo também existe violência. “O combate à violência não deve perder isso de vista”, afirmou. Taciana disse ainda que a sociedade como um todo, mas em especial as ONGs, deve avançar mais no debate sobre a segurança pública, envolvendo-se mais. Provocada por intervenções da plateia, ela disse que um dos conceitos com que a sociedade precisa ter cautela é o de paz. “Não queremos a paz da Índia, por exemplo, onde os supostos baixos índices de violência são construídos às custas de um regime religioso duro e que segrega as pessoas em castas. Esta paz nós não podemos querer”, disse.
Por uma nova política de segurança pública
Em 2009, será realizada a Conferência Nacional de Segurança Pública, e esta pode ser uma oportunidade de participar da construção de uma outra política, que pense a segurança para além da repressão. Este foi o tema da segunda sessão de debates do encontro, que contou com Ariel de Castro Alves (advogado, conselheiro do Conanda e presidente da Fundação Criança de São Bernardo), Luiz Fernando Almeida (advogado, Tenente-Coronel da PM de Sergipe) e José Antônio Moroni (do INESC - Instituto de Estudos Sócio-Econômicos e da diretoria executiva da ABONG).
Ariel de Castro Alves apontou avanços no campo da segurança pública no Brasil, mas disse que ainda é preciso melhorar muitos setores e aspectos da política, como, por exemplo, o policiamento comunitário, o sistema carcerário, as delegacias especializadas, os cargos e salários dos policiais e as delegacias de delitos de intolerância. “Precisamos também avançar no mapeamento da exclusão e da vulnerabilidade, pois ele nos ajuda a perceber que a maioria das pessoas que estão em cadeias ou unidades de medidas socioeducativas são habitantes de lugares onde o estado está ausente e não há qualquer garantia de direito, como hospitais públicos, escolas e postos de saúde”, explicou o advogado.
Luiz Fernando Almeida alerta que é preciso fazer a diferenciação entre polícia, violência e segurança pública. “A reprodução da violência é generalidade, em toda sociedade, na televisão, etc. O problema é o Estado municiar com uma arma alguém para defender a população e este alguém usa seu poder para oprimir e repreender a população que deveria proteger”, afirma o tenente. Para ele, uma política de segurança deve conter um entendimento das vísceras do sistema. “O crime está entranhado no capitalismo. A primeira atividade mais lucrativa do mundo é o mercado financeiro e a segunda e terceira são respectivamente o tráfico de drogas e o de armas. Não podemos ser ingênuos ao construir uma política para lidar com isso”, completa o advogado e tenente, fazendo uma provocação. “Precisamos assumir que a política só existe para proteger a elite do povo”.
Para o integrante da diretoria da ABONG, José Antonio Moroni, na constituição de uma política pública de segurança, enfrentaremos problemas semelhantes aos que enfrentamos para discutir políticas econômicas e desenvolvimento. “Um dos problemas é que pensamos uma política de segurança pública como aquela com objetivos militares e de proteção do patrimônio. Não conseguimos pensar que segurança pública deve existir para garantir as liberdades”, diz, apontando uma vontade política da ABONG de acumular mais neste debate, em especial este ano, em função da realização da conferência nacional.
“Para pensar outro patamar de política para a segurança, temos que romper com preconceitos e assumir que a área da segurança é onde as contradições da sociedade ficam mais explícitas”, diz, afirmando que existe uma relação intrínseca da polícia com a violência, seja por omissão, cobertura ou envolvimento direto. “A sociedade brasileira opta pela violência para resolver conflitos tanto no âmbito social, quanto no privado. O exercício que temos que fazer é de pensar que espaço público temos para resolver estes conflitos”, pondera. Hoje, para Moroni, estes espaços não existem. “Mascarar conflitos e não deixar eles aflorarem é uma forma de violência”, diz.
Para Moroni, a conferência nacional será uma oportunidade de pensarmos a segurança para além do dever do Estado com a política. “Qual o nosso papel em uma sociedade mais segura? Que dinâmicas de violência, como racismo, machismo e a homofobia estão presentes na sociedade e são incorporadas e reproduzidas pelas instituições? Como desmontar as armadilhas que nós mesmos montamos com discursos como estes? Como pensar mecanismos diferenciados de acesso a este direito?”, questiona.
* A Conferência Nacional de Segurança Pública será realizada em agosto. O site oficial é
www.conseg.gov.br

PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
CORONEL BARBONO