segunda-feira, 6 de abril de 2009

RIO DE JANEIRO - MANUAL - A IMPLANTAÇÃO EQUIVOCADA DE AÇÕES DE SEGURANÇA PÚBLICA.

Os governos do Rio de Janeiro têm fracassado seguidamente na prestação dos serviços públicos essenciais ao povo fluminense, o que tem provocado o agravamento do quadro de falência da saúde pública, da educação pública e da segurança pública.
Culpar o atual governo pela situação caótica beira a injustiça, entretanto, o governo Sérgio Cabral pode ser cobrado pelo descumprimento ostensivo de promessas de campanha e por insistir em fórmulas ultrapassadas que têm dado errado governo após governo.
A repetição dos erros é tão flagrante que poderíamos supor que tais fórmulas mágicas estivessem inseridas nas políticas ideológicas do PMDB, entretanto, sabemos que os partidos políticos do Brasil perderam inteiramente a sua identidade, então, não podemos pensar em ideologias partidárias.
No caso específico da segurança pública a repetição dos equívocos beira ao absurdo, parecendo que os atuais gestores nunca tiveram qualquer informação sobre as estratégias políticas adotadas na segurança pública, pelos governos que os antecederam.
Eles mostram que estão totalmente desinformados sobre o que já deu errado no Rio de Janeiro e, ainda, não conhecem o que tem dado certo em outros estados brasileiros.
A seguir vamos comentar brevemente alguns dos erros mais evidentes, os quais não estão relacionados em razão da importância:
1. Insistem em não valorizar o profissional de segurança pública, pagando salários incompatíveis com o risco e a importância da missão policial. O Rio de Janeiro paga um dos piores salários do Brasil, embora o estado seja um dos que mais recursos arrecada.
2. Não valorizando a todos, teimam em distribuir gratificações a uns e a outros não. Tal procedimento longe de estimular os que recebem, desestimula gravemente os que não recebem. Ao longo do tempo temos erros graves, como a gratificação faroeste (pecúnia), que foi incorporada, por decisão judicial – a gratificação por mortes. Atualmente, temos os cursos pela internet, que distribuem gratificações, sem qualquer controle a respeito de quem fez o curso, o policial, um familiar ou um amigo. Como podem achar que isso proporciona qualquer aprimoramento técnico-profisssional. Tais gratificações invertem a hierarquia, fazendo com que inferiores hierarquicamente, ganhem mais que seus superiores, afetando a própria disciplina. O erro mais grosseiro foi o aumento de 223% na gratificação recebida por alguns Coronéis de Polícia, alavancando o valor para cerca de R$ 7.500,00, enquanto um Soldado de Polícia ganha pouco mais de R$ 1.000,00 de salário mensal.
3. Continuam investindo na quantidade ao invés de buscarem a qualidade. Anunciam que incorporarão milhares de novos Policiais Militares, mantendo os péssimos salários e ainda inviabilizando reajustes salariais, tendo em vista que a expressão “impacto na folha” será repetida novamente. Mais Policiais Militares nas ruas, estressados, cansados, desestimulados e portanto fuzis.
4. Mantém promoções pelo critério do tempo de serviço, desvalorizando por completo o critério do merecimento.
5. A Polícia Técnico-Científica (Perícia) continua atrelada à Polícia Civil, enquanto na maioria dos estados brasileiros ela é autônoma e independente. Assim sendo, a perícia contribui para o controle externo da atividade policial, auxiliando o Ministério Público, que tem tal missão.
6. A Polícia Militar e a Polícia Civil continuam sendo empregadas em desacordo com os mandamentos constitucionais. Enquanto a Polícia Militar, que tem a missão de executar o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública, está sendo transformada em uma tropa de guerrilheiros urbanos, afastando-se do servir e proteger ao cidadão (Polícia Cidadão – Policiamento Comunitário); a Polícia Civil, que tem a missão de investigar os delitos e identificar seus autores, está sendo transformada em uma força paramilitar, com os uniformes mais variados, utilizando viaturas ostensivas, helicópteros blindados e veículos blindados para transporte de tropa (“caveirão”). Erros grassos em termos de política de segurança pública.
7. Falta de autonomia administrativa e operacional da Polícia Militar e da Polícia Civil, que continuam sendo coordenadas por um ente hibrido – a Secretária de Segurança Pública -, órgão caro e totalmente desnecessário. Um paradigma do atraso na segurança pública no Brasil. As Polícias precisam gerir os seus destinos e isso em conformidade com as suas missões constitucionais.
8. No campo administrativo, a Polícia Militar continua economizando no feijão para comprar papel. A falta de dotação orçamentária adequada faz com que a instituição, às vésperas do seu bicentenário, continue economizando na comida servida à tropa para poder alimentar a Caixa de Economia, para fazer face as despesas administrativas. O retrato do atraso, um atraso recorrente, governo após governo.
9. A Polícia Civil continua com sérios problemas de ascensão funcional, em decorrência do fim do concurso interno para a função de Delegado de Polícia. A constituição prevê que tal função seja alcançada através de concurso público, o que determina que o Policial Civil de carreira – o investigador experiente – tenha que concorrer com jovens saídos das faculdades de direito, muitos nem trabalham e podem estudar o dia todo. O “tira” desgastado pelo serviço e pelo “bico”, embora sendo bacharel em direito (curso feito com muito sacrifício e à noite), não consegue concorrer em igualdade de condições. O resultado nós conhecemos, Delegados com reconhecido saber jurídico, todavia sem qualquer conhecimento sobre “Polícia” e sobre “investigação”, que não se aprende na faculdade. A taxa de elucidação de homicídios, por exemplo, reflete bem tal realidade.
10. Milhares de Policiais Militares do serviço ativo continuam afastados das ruas, espalhados pelos mais diferentes órgãos públicos. Ganham para serem policiais, não exercem a função, mas ganham o salário, além da gratificação e vantagens da função exercida fora da Polícia Militar. Policiais Militares que não trabalham na Polícia Militar e que ganham mais que os que trabalham na corporação.
11. O “bico” continua sendo a única saída para os Policiais Militares que resistem às facilidades propiciadas pelas ilegalidades. Isso faz com que Policiais Militares fisicamente esgotados e emocionalmente estressados, “policiem” as ruas portando fuzis. O fuzil é uma arma de guerra que tem como finalidade provocar o maior número de feridos na tropa inimiga (munição transfixante) e só deveria ser usada para efetuar tiros de precisão, o que não é a realidade no Rio de Janeiro, como incontáveis filmagens já demonstraram.
12. Alardeiam um “choque de ordem”, como tantos outros que já marcaram inícios de gestão, porém vemos “pontos do jogo dos bichos” em cada esquina, nas cercanias de cada Delegacia da Polícia Civil e de cada Batalhão da Polícia Militar. Uma realidade que sinaliza para o envolvimento do poder público com a criminalidade. Por que não adotam um verdadeiro “choque de ordem”, uma tolerância zero com o crime, reprimindo o jogo dos bichos? Seria um bom começo!
13. A participação no programa federal da Força Nacional de Segurança (FNS) é outro erro. No Rio de Janeiro o programa só serve para “cercar”, embora seja caríssimo para os cofres públicos (governo federal). Os integrantes da FNS ganham muito mais que os Policiais Militares e que os Policiais Civis que enfrentam – frente a frente – os criminosos. Imaginem a motivação dos nossos policiais, ganhando muito menos que a tropa que só tem a missão de cercar?
14. Apesar do evidente envolvimento de Policiais Militares e Policiais Civis com o flagelo da criminalidade, conforme a mídia notícia com freqüência, não estão sendo feitos investimentos nas Corregedorias Internas compatíveis com a grandeza da missão. Na Polícia Militar o Gabinete Geral de Assuntos Interno – aperfeiçoamento da atividade correcional – ainda não foi implantado. A garantia de escolha da próxima unidade pelos Policiais Militares que deixam a área correcional foi extinta pelo atual governo, vulnerabilizando os agentes correcionais.
Cidadão, não comentarei os muros - o cerco às favelas da Zona Sul -, pois isso já está sendo suficientemente criticado. Inclusive o Prefeito Eduardo Paes (PMDB) já condenou a idéia do Governador Sérgio Cabral (PMDB), em data pretérita.
Eu poderia ficar horas diante do monitor enumerando erros, porém esse não é o objetivo deste breve artigo, sobretudo considerando que tais erros já foram citados neste espaço democrático dezena de vezes.
O objetivo é relembrar, reacender a discussão, para que possamos parar de errar, isso não é humano.
Os cidadãos fluminenses merecem serviços públicos de qualidade, operacionalizados por servidores públicos adequadamente remunerados e com as melhores condições de trabalho.
O Estado existe para promover o bem estar da sociedade e não, o bem estar de poucos.
Nós somos os patrocinadores do Estado, queremos que os nossos recursos sejam utilizados corretamente e não queremos patrocinar o Coral do Senado, por exemplo, isso é uma afronta, tendo em vista que no Rio de Janeiro, cidadãos ainda morrem em filas e em corredores de hospitais.
Os nossos recursos não podem continuar sendo mal empregados em erros sucessivos.
Por derradeiro, não posso deixar de registrar que o Rio de Janeiro acaba prestando um excelente serviço aos demais entes federativos, no campo da segurança pública, considerando que a constante repetição dos nossos erros, serve de aprendizado para os outros, que não repetindo as nossas ações, estão a meio caminho do sucesso.
Quem deixa para aprender com os próprios erros...


PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
CORONEL BARBONO