segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

REVISTA VEJA - JOVEM POLICIAL - LYA LUFT

Revista Veja – Editora Abril – edição 2.044 – ano 41 – número 3 – 23 de janeiro de 2008.

Coluna Ponto de Vista – LYA LUFT - Escritora

O JOVEM POLICIAL

“Eu estava botando gasolina no tanque do meu carro e do meu lado estavam dois carros da Brigada Militar. Dois policiais falavam com alguém do posto. Um terceiro, bem junto da minha janela, de costas para mim, portava uma arma grande, que na minha ignorância acho que poderia ser um fuzil ou uma metralhadora. Estava ali, sozinho, e comecei a observá-lo sem que me notasse. Tenso, alerta, consciente de sua missão, olhava para os lados empunhando a sua arma com o cano voltado para baixo. Seu rosto era jovem, tão jovem que me comovi. Podia ser meu filho. Mais: podia ser meu neto. Estava tão concentrado no seu dever, tão alerta na sua posição, que fiquei imaginando se, ou quando, ele poderia levar um tiro de algum bandido. Poderia ficar lesado gravemente. Poderia morrer. Por mim, por você, por um de nós, em qualquer parte do Brasil, não importa que nome se dê a sua corporação, nem se é da guarda estadual, municipal ou federal. Esses jovens se expõem por nós. Morrem por nós. Tentam, num país tão confuso, proteger o cidadão. A gente realmente pensa nisso? Uma vez ao dia, uma vez por semana, uma vez ao mês?
Tentei imaginar também como eu me sentiria se um dos meus netos tivesse essa profissão. Que suspiro de alívio a cada noite, ou a cada manhã, sabendo que ele estava em casa. Que angústia sempre que se noticiasse uma perseguição, um tiroteio. Quanto ganha para se expor assim um rapaz desses? Esse tinha na mão esquerda uma fina aliança. Podia ter filhos, com certeza muito pequenos, dada sua pouca idade. Que vida a de milhares de famílias, em troca, penso eu, de uma compensação financeira diminuta.
Impressionada com sua seriedade, com a realidade concreta daquela arma enorme, e com quanto de repente me senti em dúvida com aquele quase menino, teimei em adivinhar: quanto ganharia ele? Tanto quanto uma boa empregada doméstica, que não arrisca a vida, embora seja importantíssima numa casa bem organizada onde a valorizam? Tanto quanto uma professora de escola elementar, que vende quinquilharias ou doces feitos em casa para colegas no intervalo, a fim de se sustentar?
Tanque cheio, saí rodando, pensativa: a educação e a segurança são o primeiro eixo da vida de um país digno. Elas e outros tantos fatores. Mas eu, naquele dia, quis pensar em educação e segurança. Com elas gastam-se quilômetros de papel e uma eternidade de falação. Se fôssemos um país mais educado, menos policiais morreriam por nós, com certeza menos cidadãos seriam assaltados, violentados e mortos, menos jovens se tornariam malfeitores, menos força teriam os narcotraficantes. Menos jovens de classe média alta se matariam nas estradas ou venderiam drogas mortais a seus colegas nas escolas ou nos bares.
O problema, o dilema, a tragédia é saber por onde começar: educação começa em casa. Mas, diz um psicólogo amigo meu, os meninos (e as meninas) problemáticos (aqui não falo dos saudáveis que constroem uma vida) em geral não tem pai nem mãe em casa, e têm poucos modelos bons a seguir. Nas escolas, professores e professoras são mal pagos, desestimulados, sobrecarregados e desanimados (não todos, portanto não me xinguem por isso). Nesse caso, a educação deveria começar pelo alto: pelas autoridades, pelos políticos, pelos líderes. Não posso dizer que o Brasil está sendo brindado com uma maioria de políticos modelares, de líderes positivos, de autoridades de atitude impecável.
Então vivemos um dilema triste: começar por baixo, pela faixa etária menor, pela educação em casa e nos primeiros anos da escola, ou começar a reformar a mentalidade dos altos escalões, nos quais alguns líderes se destacam pela autoridade moral e elevada postura, mas a maioria, sinto muito, está longe disso?
Não creio que haja resposta. Eu não a tenho. Quem tiver que sugira aos governos, ou aos pais, ou aos colégios. De momento, parece-me que estamos apenas despertando para essa crucial questão, sem a qual nada se fará de importante neste nosso país das utopias”.

Cara escritora LYA LUFT, o seu artigo além do convite à reflexão, já contém algumas respostas.
Os investimentos em educação e em segurança são pré-requisitos para começar a afastar o Brasil desse quadro de desorganização e degradação social.
O professor precisa ganhar bem, muito bem.
O policial precisa ganhar bem, muito bem.
E que se operem todas as medidas necessárias para que isso ocorra, esse é o dever dos governantes.
Enquanto isso não ocorrer, continuaremos mergulhados na corrupção e sem qualquer contrapartida para os pesados impostos que coercitivamente pagamos para manter esse estado caótico.
E que cada brasileiro, uma vez por dia, uma vez por semana ou uma vez por mês, faça como a senhora e se coloque na posição de mãe (pai) ou avó (avô) de um dos milhares de jovens Militares de Polícia, que arriscam a vida diariamente em nossa defesa.
Eles morrem por nós e devem ser valorizados corretamente, em razão de arriscarem a vida por nós, esse precisa ser o parâmetro.
E respondendo a sua pergunta, no Rio de Janeiro eles ganham menos de R$ 30,00 (trinta reais) por dia, menos que a metade de uma boa diarista.
E no Rio Grande do Sul, estado onde a senhora vivenciou essa experiência, vendo esse jovem policial, a realidade salarial não é diferente.

PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
CORREGEDOR INTERNO

7 comentários:

Anônimo disse...

Cel Paúl.
A sociedade fluminense deu o melhor exemplo de como mudar esse estado de coisas. A sua mobilização obrigou o Prefeito a retroceder nesse aumento absurdo do IPTU, mascarado pelo término de um pseudodesconto (sic). O que ocorreu com nossos cidadãos de bem foi se deixar dominar pelos maus. Fomos acuados no "CANTO DO RINGUE". Mobilização ordeira de toda a sociedade. INDGNAÇÃO JÁ!!!!
Devemos mostra aos corruptos,traficantes, maus cidadãos etc que queremos uma sociedade melhor, e que "DAMOS AS CARTAS". Abaixo a hipocrisia daqueles que compram objetos de procedência duvidosa, usam drogas, dão propinas para seus estabelecimentos não serem multados por fiscais, subornam o PM no trânsito ... e clamam por ordem e segurança. Quem finacia a violência e a corrupção????? Serão por acaso os marcianos????? Esse seria um bom ponto de partida para alcançarmos " A SOCIEDADE QUE QUEREMOS".

Respeitosamente.

Hiran Quintanilha - TEN PM

CHRISTINA ANTUNES FREITAS disse...

Sr.Cel.Paul:

O artigo de Lia Luft, reflete bem o olhar feminino (um tanto mais detalhista) para o Policial Militar.
Lia Luft não só vê este Policial como alguém que está ali para colocar "ordem" na desordem das cidades, mas como um ser humano com suas necessidades básicas, raro excessões, nunca atendidas.
Muito bom para o coração de Lia (sim, coração mesmo, aquele que temos que tratar com o médico) não ser mãe nem avó de Policial Militar.
Por esse motivo ela não pagará o "mico" de ligar no meio da madrugada ao acordar de um pesadelo, não será argüida, sistematicamente, porque deixou seu filho ser Policial. E não terá aquela sensação de que seu filho ou neto trabalha em situação de risco absoluto, e ganha talvez menos do que qualquer garota de programa em uma noite!
Ela Lia, não verá essa inversão de valores!
Mas como uma mulher nacionalmente conhecida por seus maravilhosos livros, pode e já está ajudando muito a todos os Policiais Militares do Brasil, com esse artigo de tanta sensibilidade!
Obrigado Lia Luft!
Obrigado Cel. Paúl pela transcrição!

Um abraço,
CHRISTINA ANTUNES FREITAS

Anônimo disse...

Caro Sr Cel Paúl...e Sra Lya Luft...Lendo o artigo transcrito no "Blog", CHOREI....chorei por lembrar de meus companheiros que já se foram, pelos presenciei indo... pelas agruras que já passei no patrulhamento, pelos traumas que carrego comigo por conta do serviço de rua, pelas injustiças a que somos submetidos como PMs...chorei...chorei e sequei as lágrimas e sorri...Pois vejo que ainda há pessoas do BEM que nos vêem como somos...SERES HUMANOS....Parabéns ao Sr Cel Paúl, Sra Lya Luft e todos meus companheiros das PMs do BRASIL!!!!!

Anônimo disse...

Caro Cel Paul,


Sou policial civil do com 30 anos de serviço; professor na PMERJ E PCERJ e vejo a policia do Estado do Rio de Janeiro e do Brasil passando grandes dificuldades, principalmente com salários e gostaria de que a justiça, a mídia e a socieddae meditassem no que tenho a falar.
Partindo do pressuposto de que na prestação jurisdicional do Estado ou melhor na persecução Penal, necessitamos da estrutura POLICIA MILITAR (preservação do local de crime); POLICIA CIVIL (apuração das infrações penais); CRIMINALISTICA (pericia de local e médico legal);DEFENSORIA PÚBLICA (defesa) ; MINISTÉRIO PÚBLICO (acusação estatal) e JUSTIÇA (sentença). Como podemos funcionar se na função inicial a preservação do local de crime é feita pelo soldado da policia militar recém formado com o salário no valor de R$754,00 (Setecentos e Cinguenta e Quatro Reais) ; ao Inspetor de Policia R$ 1.300,00 (Hum Mil e Tre\entos Reais); ao Perito R$1.800,00(Hum Mil e Oitocentos) do Delegado R$5.000,00(Cinco Mil reais). Agora Pasme ao MINISTÉRIO PÚBLICO o salario de R$20.000,00 (VInte Mil Reais) a 24.000,00 (Vinte e Quatro Mil reais) e ao Juiz nem se fala e ainda 60 dias de férias.
Tenho um professor no Curso de Pós Graduação, que é Promotor de Justiça e lhe fiz este comentário. Ele muito envergonhado disse que o fato contituia uma vergonha, então lhe perguntei. Porque o Ministério Público que é o fiscal da Lei não muda este estado de coisa ? le me respondeu que ninguém legisla em causa alheia..........

Não podemos botar os miseráveis para tomar conta do ouro !
--
Daniel Gomes

Anônimo disse...

Como policial civil me emocionei por amigos que perdi tanto da minha instituição como amigos da Polícia Militar. Não vejo diferença entre as duas instituições - Somos apenas peça de uma engrenagem sendo manipulada politicamente. Sequer podemos ter voz. Onde está a democracia? Parece que o Secretário de Segurança se perdeu nos tempos da Ditadura e exonerou uma pessoa competente por dizer a verdade: é fato que o baixo salário é um dos fatores que induzem à corrupção. Claro que não é o único, senão, não existiria secretário corrupto, governador corrupto, Brasília não estaria cheia de corruptos, mas negar a verdade é uma demagogia burguesa inaceitável, que já não engana a sociedade, ou eles pensam que a sociedade não conhece seus métodos!!!!!

Anônimo disse...

Sou cabo da corporãção,participei da passeata,e nos falamos no final,lembra?
Bem,atravessamos a ponte e não podemos voltar atrás,a ponte caiu!
O Srº.secretário de segurança pública tem que está preocupado é com a corrupção da política de segurança...
juntos,somente juntos seremos forte,haja o que houver,não vamos nos acovardar, o senhores coronéis precisam ir ate o final,nós da corporação estaremos juntos, é só ter comando.
Espero não ter sido indisciplinado,mas sim mais um dos aliados.
Desde já,parabéns por todo empenho e dedicação a todos os seus subordinados.
abraços.
CBPM 57000.

Carlos Gabi e Mel disse...

Caro amigo,

Estamos aqui na Ilha de Itaparica, geridos por uma prefeitura (Vera Cruz) para lá de incompetente e omissa...e quem nos tem 'salvo' nestes anos de invasão de marginais de outras paragens tem sido a nossa 5ªCIPM com seus Oficiais operacionais fazendo das tripas coração....sem viaturas, com efetivos reduzidos e com pouco apoio da capital.
A Policia Rodoviária (Cap Sandro) dando o seu melhor.... e assim a nossa querida Ilha vai vendo a canoa evitando se afundar até as proximas eleições ...e para isso temos que trabalhar para ter gente séria e competente comandando os destinos de Vera Cruz....um absurdo o estado atual das coisas.
Um OBRIGADO aberto para a nossa PM/PR ...sem a qual esta 'canoa' já teria afundado.
Em 2012 teremos um gestor à altura...
Um abraço amigo

Carlos e Gabi
Cacha-Pregos,Vera Cruz,Bahia