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quinta-feira, 5 de abril de 2012

RIO: UERJ - GRUPO DISSENSO - CICLO DE DEBATES .

PROGRAMA:
1) Terça 10/04 – 10:30 > Law and Economics
Objetivo: Propor uma discussão sobre os efeitos econômicos da legislação, buscando analisar e estudar as relações entre direito e economia.
Debatedores:
Lado 1 – Prof. Ubiratan Iorio (UERJ) e Bernardo Santoro (mestrando - UERJ)
Lado 2 – Prof. Rodrigo Lychowski (UERJ) e nome a definir
Mediador: Prof. João Eduardo (UERJ)
2) Terça 10/04 – 18h > CADE e o direito concorrencial
Objetivo: Analisar a atuação do CADE em relação ao direito concorrencial, tanto na teoria quanto na prática.
Palestrantes:
André Ramos (Procurador Federal)
Hélio Beltrão (Presidente do Instituto Mises Brasil)
Thompson Andrade (professor da UERJ e antigo conselheiro do CADE)
Mediador: Patrick Gappo
3) Quarta 11/04 – 10:30 > Constituições na União Europeia: desafios da pós-modernidade
Objetivo: Discutir os limites entre o poder constituinte, os princípios comunitários europeus, as ideologias vigentes na UE e as garantias democráticas, a partir do exemplo dos conflitos acerca da Constituição Húngara de 2011.
Palestrantes: Matheus Sena (UERJ) e Prof. Rafael Zelesco (UERJ)
4) Quarta 11/04 – 16h > Debate sobre teorias de justiça de Rawls e Nozick
Objetivo: Apresentar para os alunos um debate importante no meio acadêmico de muitas universidades comparando as teorias de justiça de Rawls e Nozick
Debatedores:
Rawls – Prof. Marcello Ciotola (UERJ)
Nozick – Prof. Diogo Costa (IBMEC-BH)
Mediador: Gustavo França
5) Quinta 12/04 - 10:30 > Questões controvertidas do novo Código de Processo Civil
Objetivo: Refletir sobre as (inter)conexões entre as estruturas processuais, a liberdade e a democracia, problematizando a intervenção judicante na vida moderna – judicialização do cotidiano e ativismo judicial – bem como a possível intensificação desses fenômenos face à nova codificação processual.
Palestrantes:
Prof. Humberto Dalla (UERJ)
Prof. Rodrigo Mezzomo (Mackenzie)
Mediadora: Ana Luiza Calil.
Maiores informações: Patrick Gappo - patrickgappo@msn.com
Divulguem e participem.
Juntos Somos Fortes!

terça-feira, 1 de março de 2011

DISCRICIONARIEDADE: PODER OU DEVER?

BLOG DO RICARDO OSCAR VILETE CHUDO
Discricionariedade: Poder ou Dever?

Este trabalho tem por finalidade um importante tema do Direito Administrativo, muito discutido, mas ainda com de grandes controvérsias doutrinárias.
Objetivo é analisar os mais importantes aspectos da discricionariedade administrativa para que, se possa concluir acerca do tema sugerido.
Entende-se fato jurídico, em sentido amplo, como sendo uma verdadeira espécie do gênero fato, este definido como qualquer transformação da realidade. O qualificativo jurídico, por sua vez, significa que o fato concreto é regulado pelo direito e que o mesmo irá gerar, modificar ou extinguir uma relação jurídica.
É certo afirmar, a título de exemplo, que a queda espontânea de uma árvore tanto pode ser caracterizada como um "fato jurídico", ou apenas um "fato" em sentido amplo. Assim, se a queda de tal árvore ocasionou prejuízo a outrem, seja qual for o tipo de prejuízo, o responsável pelo dano responderá perante o direito, todavia, se a árvore apenas caiu, não causando qualquer dano, o ocorrido foi apenas um fato sem qualquer relevância jurídica.
Desta forma, de acordo do com tal entendimento, fato jurídico em sentido estrito é apenas o acontecimento provocado por agentes da natureza, independente da vontade humana e que, repercutindo na vida jurídica, cria, modifica e extingue relação jurídica. Os atos jurídicos, por sua vez, seriam todo e qualquer acontecimento decorrente da vontade humana, com repercussão no mundo dos direitos.
Necessário se faz lembrar o princípio da legalidade inerente à Administração, que traduz a idéia de inteira dependência desta para com a lei. A Administração Pública só pode atuar mediante o permitido em lei. Deste modo, é certo afirmar que o atuar administrativo, seja no âmbito vinculado ou discricionário, há sempre que estar coincidente com o princípio da legalidade, bem como com os demais princípios administrativos, ou seja, a moralidade, impessoalidade, publicidade etc.
É de suma relevância verificar as diferenças básicas entre o ato vinculado e discricionário, quando já se sabe que não se inclui em tais diferenças a obediência à lei. Pode-se dizer que há ação vinculada quando a norma a ser cumprida determina com rigor e objetividade o comportamento da Administração diante de certa situação fática. Na ação discricionária, por sua vez, ocorre uma certa margem de liberdade de escolha ou decisão para que o administrador verifique, sob os critérios de conveniência e oportunidade, qual a melhor solução para a efetivação da finalidade pública.
Não se pode afirmar a existência de um ato discricionário na sua totalidade, visto que o administrador nunca desfruta de uma liberdade total, havendo sempre a inevitável vinculação quanto ao fim público e à competência.
Tendo em vista essa total dependência do administrador, em sua ação discricionária, à finalidade pública, não seria mais coerente se falar em "dever discricionário", do que atribuir à essa função uma idéia de "poder" ?
A discricionariedade conferida ao administrador está confinada a vários limites, sem os quais se evidenciaria uma verdadeira arbitrariedade. Em um Estado de direto não se concebe liberdades irrestritas, tendo em vista que todos os atos estatais devem estar correspondentes ao princípio da legalidade. O princípio da finalidade, o qual afirma que o administrador deve sempre buscar o fim específico da norma, que, certamente, será coincidente com a finalidade maior da Administração, ou seja, o bem comum. Em não agindo dessa forma, incidirá o agente na hipótese do desvio de poder ou de finalidade, o que torna o ato passível de invalidação.
Em se fazendo uma análise a fundo, verificar-se-á que a extrema vinculação do administrador à finalidade pública decorre do caráter funcional da atividade administrativa que pressupõe a idéia de um poder-dever ou dever-poder, como afirmam alguns doutrinadores.
Constata-se, nesse ponto, que o possível "poder" conferido à Administração significa nada mais que o "dever de alcançar a finalidade legal”, daí concluir-se que tal poder é um mero instrumento para se atingir essa finalidade, ou seja, obter o cumprimento do dever de bem administrar, este sim, fundamentador do Direito Público. Deste modo, o agente administrativo deverá atuar sempre, seja totalmente vinculado à lei ou mediante certa discrição, no intuito de dar cumprimento ao dever-poder de gerir a res pública, ou seja, alcançar a finalidade pública específica da norma.
Pelo exposto, entende-se ser mais apropriada a expressão "dever discricionário", do que auferir ao caráter funcional da Administração Pública uma errônea idéia de "poder ".
A discricionariedade é uma margem de liberdade conferida pelo legislador ao administrador, em virtude da impossibilidade do regramento exaustivo de todas as situações do mundo empírico, e também pelo fato de o legislador não ter como evitar o uso de conceitos fluidos em determinadas normas, para que o mesmo escolha, dentre vários caminhos previamente respaldados pela lei, o que melhor satisfaz a finalidade pública, segundo uma valoração subjetiva.
Postado por Ricardo Oscar vilete Chudo às 01:27
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
PROFESSOR E CORONEL
Ex-CORREGEDOR INTERNO

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

GOVERNO SÉRGIO CABRAL: POLÍCIA CIVIL - DENÚNCIA.

EMAIL RECEBIDO:
SEPLAG - Golpe na PCERJ

Caros Colegas,
Mais uma manobra que considero escusa, desse nosso atual governo, que não respeita lei, decisão judicial, não paga precatórios etc., e que parece odiar todo funcionalismo público estadual.
Dessa vez, o fato ocorreu junto a SEPLAG, em relação ao processo judicial movido pelo chamado “Grupo dos oito”.
Como a maioria já sabe, embora esse grupo tenha obtido uma vitória na justiça (cuja a sentença transitou em julgado), ou seja, o direito de reajustar os seus vencimentos em conformidade com a Lei nº 2.990/98, o poder Executivo Estadual se recusou a cumpri-la na sua integralidade, criando uma rubrica especial 3087 (D. Jud. Rev. V/ Provl 2990/98) e depositando o referido valor na mesma, ao invés de depositar esse valor na rubrica 0018 (vencimentos), que consta nos contra cheques de todos os policiais, independente de classe ou cargo.
Embora haja divergências de opiniões entre os colegas, entendo que tal manobra se deu para evitar que toda classe policial entrasse na justiça pleiteando seus direitos proporcionais com base no princípio constitucional da isonomia.
Como vocês podem notar (no primeiro contra cheque de um dos policiais do grupo dos oito), o Estado começou a pagar tal valor em uma rubrica a parte (3087 - R$ 879, 81) denotando assim, um caráter pessoal a essa gratificação, como acontece, por exemplo, com os colegas que recebem a chamada gratificação faroeste, impossibilitando, o pleito judicial dos demais policiais com base no princípio supra mencionado.
Caso, o Estado cumprisse na integralidade a sentença judicial, esse valor deveria ser incorporado na rubrica 0018, cujo valor, no exemplo em tela, passaria de R$ 637,76 para R$ 1.517, 57 (R$ 637,76 + R$ 879,81), incidindo sobre esse novo valor, o Adicional de Atividade Perigosa (230%) + Triênio + GHP (25%) etc.
Dessa forma, como se trata de uma rubrica (0018) comum a toda classe policial, ou seja, de caráter geral, todos os colegas poderiam requerer na justiça a isonomia proporcional, em conformidade com o seu cargo e classe.
Porém, o Estado como não é bobo fez um trato com o advogado dos oito colegas, numa reunião que contou com a presença de representantes da SEPLAG, Casa Civil e PGE, reajustou a rubrica 3087 de R$ 879, 81 para R$ 1.097,45 e criou para esses colegas três novas rubricas (3921 - Adic. de 230% jud., 3939 - triênios jud. , e 3947 - GHP (25%) jud.), como pode ser visto no segundo contra cheque, mantendo assim, de forma esperta, o caráter geral das gratificações, e ao mesmo tempo atendendo ao pleito dos oito policiais (basta ver o valor bruto do novo salário do colega) e prejudicando o restante da classe policial, pois o pleito da isonomia, ao meu ver, continua praticamente impossível diante de tal situação.
Trata-se de flagrante descumprimento de ordem judicial transitada em julgado, onde o Estado perdeu todos os recursos, tanto na fase judicial de conhecimento, como na de execução, motivo claro de intervenção federal constante em nossa Carta Magna, e afronta direta aos princípios constitucionais da separação de poderes (ao criar um desequilíbrio entre os poderes Executivo e Judiciário) e da isonomia.
Importante ressaltar, que em nenhum momento culpo os colegas policiais do grupo dos oito (incluindo seu advogado) por tal situação, pois eles lutaram por seus direitos e acreditaram na justiça, enquanto vários colegas faziam piadas os chamando de “o grupo dos 8 que ganharam e não levaram”, ou falavam de forma pessimista “isso não vai dar em nada, é perda de tempo”. Está aí a resposta!
Embora esteja cansado de ver todo o dia, os absurdos de nosso Estado, de nossa Sociedade, ainda me pego, de vez em quando me indagando quase de forma inocente “que porra de país é esse, em que o Estado nos obriga a sermos honestos e a respeitarmos as leis vigentes, quando ele é o primeiro a ser desonesto e a não respeitar nenhuma delas”.
Espero que os nossos sindicatos, nossos legítimos representantes, possam se manifestar diante dessa situação absurda.
Fiz a minha parte, a verdade deve ser dita e conhecida, embora esteja indignado, estou com minha consciência tranqüila e posso dormir o sono dos justos.
Que Deus nos ajude e tenha piedade de todos nós...
PS: Por favor, solicito aos colegas, não fornecerem meu e-mail, no intuito de evitar represálias a minha pessoa. Obrigado!
COMENTO:
Divulgamos o email para que outros Policiais Civis possam se manifestar.
Infelizmente, o nosso blog atingiu o número máximo de imagens, o que nos impede de postar novas imagens, assim sendo não podemos publicar os contra-cheques encaminhados. Só conseguimos postar vídeos.
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
PROFESSOR E CORONEL
Ex-CORREGEDOR INTERNO

domingo, 22 de novembro de 2009

POUCA APLICAÇÃO DA LEI n.º 9455/97 (LEI DE TORTURA) - ADVOGADO CLEUTON BARRACHI SILVA.

ARTIGOS JURÍDICOS
www.advogado.adv.br
Cleuton Barrachi Silva (*)
1. Introdução. 2. Breves relatos históricos. 3. A tortura no Brasil dos séculos XX e XXI e o surgimento da Lei n.º 9455/97. 4. A Constituição Federal e a proteção da pessoa humana. 5. O crime de tortura e sua abrangência pela Lei n.º 8072/90. 6. Conceito de tortura física e moral e os atos que constituem este crime. 7. A pouca aplicabilidade da Lei de tortura. 8. Conclusão. 9. Bibliografia.
1. Introdução
Preferencialmente, mas não exclusivamente, o intuito deste artigo é demonstrar de forma objetiva, a pouca aplicabilidade de uma lei que conquanto tenha uma importância qualificativa em nossa sociedade (derivada de Convenções e Tratados de valores supremos, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, aos quais ratificamos e somos signatários) na maioria das vezes tornar-se subsidiária de tantas outras, perdendo em alguns casos seu valor e objetivo que é precipuamente defender a dignidade da pessoa humana.
Contudo, aproveitamos para em poucas palavras demonstrar alguns pontos históricos, tanto no direito brasileiro como no direito comparado, acerca da prática da tortura.
2. Breves relatos históricos
A história do Direito Penal nos mostra que desde a origem dos tempos existem e foram usadas várias formas de tortura para finalidades diversas, mas os métodos quase sempre são os mesmos. Neste diapasão, podemos dizer que na maioria dos casos a finalidade da tortura era a de adquirir a confissão de determinado delito imputado àquela pessoa. Todavia, nem sempre ocorria por este motivo, em outras vezes não se tinha este caráter, já que buscava-se através deste meio uma maneira de agravar o sofrimento do condenado. Enfim, de uma forma ou de outra a tortura sempre teve seu espaço no contexto histórico mundial, seja por tradição de alguns povos; seja por motivos religioso a exemplo da “inquisição”; seja por imposição do regime político adotado, nos casos do nazismo, ditadura militar, entre outras.
O fato é que seja qual for o motivo que leva determinada pessoa a usar este tratamento desumano e degradante, é sem dúvida lamentável, eis que a covardia de tal conduta é tamanha, que remete o torturado a atender a vontade implícita no íntimo do torturante, confessando qualquer que seja o crime, mesmo que inexistente, com o único intuito de cessar o sofrimento empreendido. Neste sentido, já dizia Beccaria em sua obra “Dos Delitos e das Penas”: “O inocente gritará, então, que é culpado, para que cessem as torturas que já não agüenta; e o mesmo meio usado para distinguir o inocente do criminoso fará desaparecer qualquer diferença entre ambos”
[1].
Temos ainda no contexto histórico, que muitas foram as nações que entre os séculos XIII e XVIII aboliram a tortura como meio de se encontrar uma suposta verdade, sendo que por muitos, mesmo naquela época era extremamente reprovável tal atitude. A respeito deste assunto, sabiamente Santo Agostinho discorreu em sua obra “De Civilate Dei”: “Enquanto se investiga se um homem é inocente, se o atormenta, por um delito incerto e se lhe impõe uma grande dor, não porque se saiba que é um delinqüente, o que sofre, senão porque não se sabe se o é, com o qual a ignorância do Juiz vem a ser a calamidade do inocente”
[2], podendo-se, ainda, usar também os ensinamentos de Beccaria: “interrogam a um acusado para conhecer a verdade; porém, se com tanta dificuldade a distinguem no ar, nos gestos e na fisionomia de um homem calmo, como poderão descobri-la nos traços decompostos pelas convulsões da dor, quando todos os sinais, que apontam às vezes a verdade na fronte dos culpados, estiverem alterados e confundidos? Toda ação violenta faz sumir as pequenas diferenças dos movimentos pelos quais se distingue, às vezes, a verdade da mentira”[3].
Citamos, como exemplo, a França que aboliu de forma definitiva a tortura no ano de 1789. Apesar da notória reprovação e mesmo com inúmeras nações, principalmente na Europa deixando de adotar a tortura, muitas foram as atrocidades que vários povos impuseram a partir do século XVIII, como o caso dos massacres e torturas impostas aos judeus pela Alemanha de Hitler, este ainda já em pleno século XX.
3. A tortura no Brasil dos século XX e XXI e o surgimento da Lei n.º 9455/97
No Brasil, lamentavelmente, em nosso passado bastante recente, tivemos verdadeiros absurdos com relação à prática deste repugnante instituto, em especial durante os períodos ditatoriais a que nos submeteu Getúlio Vargas (cita-se de passagem as vítimas da Intentona Comunista, liderados por Luiz Carlos Prestes), e ainda os militares a partir de 1964. O saldo, infelizmente, foi o mais repugnante possível, onde centenas de pessoas foram, torturadas, muitas enlouqueceram, outras não resistiram vindo a óbito, e poucas conseguiram suportar, conseguindo, passar sem seqüelas mais graves.
Nosso país, conquanto seja signatário de diversos tratados e convenções que dispusessem sobre o tema, como por exemplo, Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948); Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948); Carta das Nações Unidas (1945); Convenção Americana de Direitos Humanos (1969) “Pacto de San José da Costa Rica”; somente veio a instituir legislação específica em 1997, como bem disse o eminente mestre e Promotor de Justiça em São Paulo, Dr. Paulo Juricic: “A ocorrência de um fato de suma gravidade, como o da favela Naval, de Diadema, Grande São Paulo, despertou no legislador a necessidade de apressar-se em tratar a tortura como crime autônomo”
[4].
O que torna lamentável a situação é o fato de que necessitou de ocorrer toda uma gama de abusos, e somente a partir de então, o legislador passou a ouvir a voz indignada de um povo sofrido, para estabelecer parâmetros legais específicos de repressão a uma atrocidade que jamais deveria ter surgido em nossa nação.
4. A Constituição Federal e a proteção da pessoa humana.
Nossa Constituição Federal estampa como um seu principal legado a democracia, desta feita, houve-se em sua propositura uma preocupação bastante grande com a garantia dos “Direitos e Garantias Fundamentais”, usando de forma clara a Carta dos Direitos Humanos como base para esta garantia individual. Assim sendo, o Título II veio dividido em cinco capítulos que compreende do artigo 5º ao 17, e destes, o artigo 5º nos traz o Capítulo I, “dos direitos e deveres individuais e coletivos”, elencando em seus incisos a proteção real do Estado aos brasileiros e estrangeiros residentes no País.
Contudo, percebe-se, que os constituintes já demonstravam desde o início dos trabalhos, que tinham a preocupação em garantir à pessoa humana, os mínimos direitos para uma vida segura e saudável, de forma a criar princípios e garantias visando a proteção da integridade física e psíquica da pessoa humana. Adotando esta linha de raciocínio, e ainda os ensinamentos do eminente Doutor Rizzato Nunes acerca do princípio da Dignidade da Pessoa Humana, quando nos diz: “o principal direito fundamental constitucionalmente garantido é o da dignidade da pessoa humana”
[5], e continua sua obra dizendo: “... a dignidade é garantida por um princípio. Logo, é absoluta, plena, não pode sofrer arranhões nem ser vítima de argumentos que a coloquem num relativismo”[6], temos que esta garantia será ilimitada, sem fim, inesgotável, adotando-se é claro o parâmetro básico dos direitos alheios, haja vista ser ali parada obrigatória dos direitos individuais.
No que diz respeito à prática da tortura especificamente, temos já no inciso III, do artigo 5º, de nossa Carta Magna, que sua prática e qualquer outro meio desumano e degradante de tratamento está terminantemente proibido, concretizado de maneira rígida através do respaldo do Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III, da CF/88).
5. O crime de tortura e sua abrangência pela Lei 8.072/90
A lei 8.072/90, Lei dos Crimes Hediondos, trouxe em seu art. 2º, uma equiparação dos crimes tratados na lei e os crimes de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo. Desta forma, muitas foram as discussões acerca desta equiparação, eis que a Lei 8072/90, não possibilita a progressão de pena, enquanto que a Lei n.º 9455/97, possibilita tal benefício, nos termos do art. 1º, § 7º, presumindo-se pelo iniciado que assim diz: “O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado”, assim, menciona que o início será pelo regime mais grave, subentende-se que haverá tal progressão. Contudo, é pacífico o entendimento no Supremo Tribunal Federal que não é possível a extensão deste benefício, uma vez que a Lei de tortura é específica (neste sentido, RE-343795 - Rel. Min. Nelson Jobim).
Neste diapasão, conclui-se que a principal diferença entre os crimes definidos na Lei 9455/97 e os da Lei 8072/90, basicamente figura-se no tocante à progressão de regime.
6. Conceito de tortura física e moral e os atos que constituem este crime.
Para termos uma noção exata da aplicabilidade dos crimes da Lei de tortura, se faz necessário que tenha exatamente o que se entende por tortura física e tortura psíquica, sendo que, inobstante tenhamos mentalmente um conceito formado sobre o que é tortura, é imprescindível que tomemos por base um conceito científico do tema, eis que podemos, se não atermos a este, incorrermos em erro.
Desta forma, Maria Helena Diniz em seu Dicionário Jurídico nos diz que tortura: “é o suplício do condenado; sofrimento físico e moral infligido ao acusado para obter confissão ou alguma informação; ato criminoso de submeter a vítima a um grande e angustioso sofrimento provocado por maus tratos físicos e morais
[7]”. De Plácido e Silva assim a define: “é o sofrimento ou a dor provocada por maus tratos físicos ou morais. É o ato desumano, que atenta à dignidade humana. É o sofrimento profundo, angústia, dor. Torturar a vítima é produzir-lhe um sofrimento desnecessário. É tornar mais angustiante o sofrimento”[8].
O artigo 1º, da Lei 9455/97, demonstra as condutas que constitui crime de tortura, qual seja:
“I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) Com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;
b) Para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;
c) Em razão da discriminação racial ou religiosa;
II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo ou medida de caráter preventivo.
§ 1º - Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita à medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.
§ 2º - aquele que se omite em face dessas condutas, quando tinha o dever de evitá-las ou apurá-las, incorre na pena de detenção de 01 (um) a 04 (quatro) anos.”
7. A pouca aplicabilidade da Lei de Tortura
Já foi anteriormente dito que apesar de termos várias ratificações e sermos signatários de vários Tratados e Convenções, é cediço, que “o Brasil levou quase 50 anos para tipificar a conduta criminosa da prática de tortura, desde que se tornou signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948”
[9], e como dito também, apesar de todos estes compromissos internacionais, nossa nação cometeu várias atrocidades no que diz respeito à prática desta conduta abominável. Outrossim, percebe-se que, conquanto tenhamos tipificado através da Lei 9455/97 o que é tortura, o que não ocorria até então, daí pode ter saído um dos motivos para não proteção de forma prévia da prática de tortura (sob pena de ferir o princípio da anterioridade, “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”), poucos são os casos em que se consegue aplicar tal lei, pois, conquanto haja a conduta degradante e absolutamente desumana, ou seja, o constrangimento com emprego de violência ou grave ameaça, não estão na maioria das vezes, irrigadas com as circunstâncias elementares necessárias para a tipificação destas condutas como tortura.
Desta forma, o autor pode cometer, dependendo de sua ocupação e ou meio pelo qual usou da violência, vários outros tipos penais que não o da tortura. Neste sentido, muito sabidamente opinou Júlio Fabbrini Mirabete quando disse: “ao prever o crime de tortura tão-somente nas situações estabelecidas no art. 1º, I e II, e § 1º, da Lei n.º 9455/97, o legislador atendeu a orientação de Convenções Internacionais, restringindo-a àquelas situações nas quais normalmente o poder de autoridade do agente se exercita de forma ilícita, com o propósito de constranger alguém a confissões e castigos a pessoas que estejam sob seu poder, guarda ou vigilância; desta forma, não se configura o crime em referência quando o agente provoca, por violência ou grave ameaça, sofrimento físico ou mental, se inexistentes as circunstâncias elementares dos tipos previstos na lei especial”
[10].
De acordo com eminente Promotor de Justiça Paulo Juricic em sua obra “Crime de Tortura”
[11], “o sofrimento físico constitui-se na própria dor física e o mental, na angústia ou dor psíquica”. Outrossim, para constituir crime de tortura, não basta o constrangimento mediante violência, é necessário que se tenha o sofrimento físico ou mental, além do dolo de se praticar a conduta com o intuito de se obter uma das três elementares subjetivas do tipo a que alude as alíneas “a, b e c”.
Podemos dizer que a pouca aplicação da lei em tela, se dá pela pouca abrangência das condutas elencadas como tortura, ou seja, o crime de tortura pode ser por questões bastante simples, como no caso do crime de maus-tratos, pois, embora seja bastante parecidas as duas condutas, neste não há a intenção de submeter a vítima aos sofrimentos a que descreve a Lei 9455/97, enquanto que naquela, há tal intenção.
Desta feita, várias são as condutas tipificas em nosso ordenamento penal que se contrapõe com o crime de tortura, como é o caso do art. 344; 146; 136; 121, §2º, III; 148; e neste último caso, considerando o caso concreto, pode-se chegar aos artigos, 159 e 219, todos do Código Penal, onde as diferenças estão em alguns elementos e circunstâncias do tipo.
Tomemos por análise os crimes tipificados nos artigos 148, 159 e 219, qual seja respectivamente, seqüestro ou cárcere privado, extorsão mediante seqüestro (bastante comum atualmente no Brasil) e rapto. Em qualquer destes crimes, normalmente, tem-se a aplicação de medidas de violência ou grave ameaça contra a vítima, causando-lhe sofrimentos físicos ou mentais, contudo, tem-se o entendimento que para ter-se configurado o crime de tortura, é necessário que se tenha o emprego de técnicas de tortura, como por exemplo, para os sofrimentos físicos, o uso de choque elétrico, queimaduras, submersão em água fria para asfixia parcial, ou ainda técnicas psicológicas como simulação de execução, privação do sono, ruídos ensurdecedores contínuos, entre outras, e, sobretudo, precisa-se que haja a intenção de se obter qualquer daquelas elementares descritas na Lei 9455/97, como por exemplo, a de provocar ação ou omissão de natureza criminosa (art. 1º, I, “a”).
Desta feita, em muitos momentos acham-se as condutas tipificadas na lei como torturas, rodeadas de circunstâncias que obrigam o operador do direito a não aplicar a lei em questão, mesmo porque, usando o caso da extorsão mediante seqüestro, a pena cominada para este crime é bem maior que a pena para os crimes tipificados como tortura, o que obriga a um cuidado muito grande, pois, em determinados casos poderá ocorrer concurso de crimes, ou até mesmo “bis in idem”, quando neste mesmo exemplo, o delito de seqüestro não for o meio utilizado para se obter a tortura, mas sim constituir elemento integrante de outro tipo penal, não incidindo a majorante, caso contrário ocorreria a circunstância citada
[12].
A falta de um delineamento estabelecendo condutas necessariamente condizentes com nossa realidade, a imposição de um “discurso jurídico penal falso”
[13], é demonstrada na pouca aplicabilidade da Lei 9455/97, onde, infelizmente, estes desusos não se atem ao fato de que não existe em nosso país a prática destes delitos, mas sim pela inadequação efetiva desta lei à nossa realidade fática. Podemos com inúmeros exemplos citar acontecimentos que de uma maneira ou de outra poderia se aplicar a Lei em exame, quais sejam: qual o brasileiro que nunca assistiu pela TV, um compatriota servidor do Estado tomado de refém em meio a ameaças, em algumas rebeliões de presídios, principalmente paulistas e cariocas? Quantos casos de abusos praticados por policiais contra civis que por morarem em zonas pouco favorecidas, sofrem violências físicas provocadas por agressões e, mentais provocadas por ameaças? Quantas pessoas diariamente são mantidas sob pressão do tráfico nos morros e favelas de nosso país, sendo obrigadas a legitimar em alguns casos, verdadeiros exemplos de “poder paralelo”?
Infelizmente, temos de reconhecer que, inobstante se tenham pessoas em nosso país que trabalhem hodiernamente para um desenvolvimento socialmente justo, existe, um falso discurso jurídico penal, e neste caso usando as palavras do eminente penalista Raúl Eugênio Zaffaroni, esse discurso: “não é nem um produto de má-fé, nem de simples conveniência, nem o resultado da elaboração calculada de alguns gênios malignos, mas é sustentado, em boa parte, pela incapacidade de ser substituído por outro discurso em razão da necessidade de se defenderem os direitos de algumas pessoas”
[14].
8. Conclusão
Inexoravelmente, podemos concluir que, embora tenhamos uma Lei que reprime uma conduta tão abominável, e que nosso país vive constantemente sob o desleixo da prática deste crime, e que mesmo pelo fato de nossa Constituição Federal elevar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana a um patamar considerável de supremacia frente aos demais (art. 1º, III, da C.F/88), temos de viver diante a inaplicabilidade da Lei de Tortura (Lei n.º 9455/97), pelos motivos singelos, antes vistos em tantas outras leis promulgadas em nossa nação, que se resume no despreparo de legisladores que nem sempre atentam para a necessária abrangência da norma, mas sim pela intuição premeditada da certeza do voto, senão, pelo “discurso jurídico-penal falso”, citado por Zaffaroni
[15].
Assim sendo, não querendo sobrepor a pequena notoriedade deste artigo, a excelência de nossos legisladores, mas certos de que a abrangência da norma em tela não alcançam a todos os infratores, preferindo ater nas contidas palavras de Montesquieu quando disse: “Tantas pessoas notáveis e tantos belos gênios escreveram contra essa prática, que eu não ouso falar depois deles. Atrever-me-ia dizer que ela poderia convir nos governos despóticos, onde tudo que o medo inspira participa do princípio do governo; diria também que os escravos entre os gregos e romanos... Mas ouço a voz da natureza gritar contra mim”
[16]. Contudo, nós aplicadores do direito, temos que sempre lutar por uma sociedade que dê aos seus filhos, o mínimo de dignidade humana.
9. Bibliografia
JURICIC, Paulo. Crime de Tortura. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 1999.
BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Ed. Martin Claret, 2001.
SHECAIRA, Sérgio Salomão & CORRÊA JUNIOR, Alceu. Teoria da Pena. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002.
ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em Busca das Penas Perdidas – A Perda de Legitimidade do Sistema Penal. Rio de Janeiro: Ed. Revan, 5ª edição, 2001.
DA SILVA, José Geraldo. LAVORENTI, Wilson & GENOFRE, Fabiano. Leis Penais Especiais Anotadas. São Paulo: Millennium Editora, 3ª edição, Revista, atualizada e ampliada, 2002.
RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana – Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Editora Saraiva, 2002.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. São Paulo: Editora Saraiva, 4ª edição, revista. 1999.
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico, Volumes 1, 2, 3 e 4. São Paulo: Editora Saraiva, 1998.
MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. São Paulo: Editora Martin Claret, 2002.
DIREITO PENAL
[1] Beccaria, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Ed. Martin Claret, 2001.pág.39.
[2] Juricic, Paulo. Crime de Tortura. Ed. Juarez de Oliveira. 1999.
[3] Op. Cit. 01, Pág. 39/40.
[4] Op.Cit.02. Introdução.
[5] Nunes, Luiz Antonio Rizzato. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Doutrina e Jurisprudência. Ed. Saraiva. 2002. p. 45.
[6] Idem, p. 46.
[7] Diniz, Maria Helena. Dicionário Jurídico. Ed. Saraiva. 1998.
[8] Silva, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Vol. IV. Rio de Janeiro. Ed. Forense, 1986.
[9] Silva, José Geraldo da. Lavorenti, Wilson. Genofre, Fabiano. Leis Penais Especiais Anotadas. 3ª edição, revista, atualizada e ampliada. Editora Millennium, 2002. p. 145.
[10] Mirabete, Julio Fabbrini. Tortura: notas sobre a Lei nº 9455/97. Revista da Associação Paulista do Ministério Público. Agosto de 1997.
[11] Op. Cit. 2. Pág. 72.
[12] Idem, pág. 77.
[13] Zaffaroni, Eugênio Raúl. Em busca das penas perdidas “a perda de legitimidade do sistema penal”. Ed. Revan, 5ª edição, 2001.
[14] Idem, pág.14
[15] Ibidem, pág. 14.
[16] Montesquieu. Do Espírito das Leis. Ed. Martin Claret. São Paulo: 2002.
Leia também sobre a Lei dos Crimes Hediondos:
Jus Navigandi.
Lei de Crimes Hediondos: uma abordagem crítica.
Elaborado em 11.2002.
Marcio Gai Veiga
advogado
(...)
1 ESCORÇO HISTÓRICO
A repressão aos crimes hediondos teve início com a Carta Política de 1988, a qual determinou o seguinte:
"A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem". (2) (sic)
(...) (leia)
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
Ex-CORREGEDOR INTERNO

sábado, 12 de setembro de 2009

A LEI DE TALIÃO AINDA SOBREVIVE PARA O AUTOR DO CRIME DE ESTUPRO - DELEGADO ARCHIMEDES MARQUES.

A LEI DE TALIÃO AINDA SOBREVIVE PARA O AUTOR DO CRIME DE ESTUPRO.
(*Archimedes Marques)
“O crime não é somente uma abstrata noção jurídica, mas um fato do mundo sensível, e o criminoso não é um modelo de fábrica, mas um trecho flagrante da humanidade.” (Nelson Hungria)
Dentro de um País em que se vive o Estado Democrático de Direito para todos, inclusive para o cidadão que se encontra preso sob a responsabilidade do Estado, aparece a figura do estuprador sendo vítima de crime idêntico no seu encarceramento, desmistificando assim, os seus direitos estabelecidos na Constituição Federal e sentido o peso da antiga Lei de Talião para consigo.
Conhece-se como Talião o antigo sistema de penas pelo qual o autor de um delito devia sofrer castigo igual ao dano por ele causado.
Os primeiros indícios de existência da Lei de Talião foram encontrados no Código de Hamurabi, em 1780 a. C. no reino da Babilônia.
Esse sistema vigorou em muitas legislações remotas. A máxima OLHO POR OLHO, DENTE POR DENTE fora vivenciada por muito tempo em quase todas as Leis das diversas Nações. A pena de Talião foi praticada de forma mais abrangente e comumente na Idade Média.
A Lei de Talião, embora absurda e abominável aos olhos atuais, era uma necessidade preeminente daquela época em que o homem era bárbaro, época em que o homem tinha pouca ou nenhuma consciência do que era o respeito ao seu semelhante, e que só era contido pelo medo dos castigos, tão ou mais cruéis do que o próprio ato praticado.
A Lei de Talião era interpretada não só como um Direito, mas até como uma exigência social de vingança em favor da honra pessoal, familiar ou tribal.
A história mostra exemplos de sistemas arbitrários, violentos e desumanos, como os sistemas feudais e monárquicos europeus, nos quais a crueldade era legalizada em contrapartida a determinados atos considerados insanos.
O Brasil colônia de Portugal, assim como tal, também se adaptou e se amoldou de certa forma à própria Lei de Talião com aplicação de penas pertinentes abusivas e desumanas.
As chamadas “Ordenações do Reino” que compunham as Leis Manuelinas, Afonsinas e Filipinas, formavam a base do sistema penal português, que por sua vez também vigorava no Brasil. Entre as penas estavam a morte, a mutilação através do corte de membros, o degredo, o tormento, a prisão, o açoite e a multa. O homem que praticasse determinados crimes sexuais poderia ser condenado à castração ou ao corte do seu membro viril. Até mesmo depois da sua Independência de Portugal, o Brasil continuou adotando penas não menos violentas na sua organização penal.
A Revolução francesa, em 1789, onde prevaleceu a trina filosófica liberdade, igualdade e fraternidade, influenciou a maioria dos Países para novos tempos. O mundo que vivia sob a égide de governos tiranos e ditatoriais sofreu uma mudança de mentalidade, daí foram nascendo, crescendo, florescendo e frutificando as idéias democráticas.
Com a evolução das eras nasceu a idéia do Estado Democrático de Direito, ou seja, um regime em que todos são iguais perante a Lei, tanto o Estado quanto o cidadão está sob o império da Lei.
A pena de Talião e outras cruéis desapareceram nas legislações modernas na quase totalidade dos Países, sob a influência de novas doutrinas e novas tendências humanas relacionadas com o Direito Penal.
A segunda Grande Guerra que mostrou para o mundo os horrores do Holocausto comandados pelas autoridades Nazistas e a insanidade das explosões atômicas perpetradas pelos Estados Unidos contra o povo do Japão, urgiu mudanças radicais para o respeito dos direitos humanos.
Pouco mais de dois meses após o final da Guerra, mais de perto, em 24 de outubro de 1945, a Organização das Nações Unidas (ONU) começou a existir oficialmente. Fundada então por 51 países, entre eles o Brasil, a ONU, tinha na sua essência a luta pelos direitos humanos, o respeito à autodeterminação dos povos e a solidariedade internacional.
A Assembléia Geral da ONU logo tratou de constituir a Declaração Universal dos Direitos do Homem. O chamado Documento da Humanidade que tomou por base os ideais da Revolução Francesa ocorrida cerca de dois séculos antes, foi aprovado em 10 de dezembro de 1948.
A Declaração trouxe no seu bojo o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que para cada indivíduo e cada órgão da sociedade houvesse a interação através do ensino e da educação, por promover o respeito aos direitos e liberdades do ser humano.
A partir de então os Estados Membros da ONU assumiram o compromisso de adotar os preceitos estabelecidos naquele documento em suas próprias Leis, não em forma de imposição, e sim, em forma de espontaneidade e aceitação do proposto para a melhoria de todos.
A Constituição brasileira de 1946 foi notadamente um avanço da democracia e das liberdades individuais do cidadão. A partir de então todos os brasileiros passaram a se amoldar à nova realidade, ao chamado Estado Novo.
Entretanto, no seu período adaptativo do Estado Novo e da premissa do Documento da Humanidade tão aplaudido e seguido pelos povos de outras nações, o Brasil logo se desmistificou e caiu em contrariedade à Declaração Universal dos Direitos do Homem com o Golpe Militar de 1964.
No chamado “período de chumbo” que perdurou por cerca de duas décadas, os brasileiros tiveram os seus direitos totalmente desrespeitados até mesmo pelo próprio Estado que se denominou repressão ditatorial.
Com a Constituição de 1988, houve a consolidação da cidadania que tinha sido proposta há 40 anos antes dessa data, pela Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Assim, a Carta Magna trouxe no seu bojo a consagração dos Direitos Humanos. Houve a preocupação primordial do Constituinte com o cidadão, assegurando-o, a inviolabilidade do seu direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Em decorrência desses aplaudidos preceitos a nossa Lei Suprema arrebanhou o título de Constituição Cidadã.
O art. 5º da Constituição Federal que estabelece a igualdade de todos perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, especifica também os Direitos do preso e do processado através dos seus itens:
XVLIII – a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado.
XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral.
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
A Lei de Execução Penal estabelece os outros princípios inerentes ao preso a serem observados pelas Autoridades constituídas.
Apesar do lapso de tempo decorrente do vigor da atual Constituição, o Estado Nação e os Estados Membros ainda não conseguiram concluir tais preceitos relacionados a esses direitos à contento, principalmente no que tange à questão dos estabelecimentos prisionais distintos de acordo com a natureza do delito de cada apenado ou processado.
Com o vertiginoso aumento da criminalidade em todos os Estados do País os presídios estão cada vez mais cheios, superlotados, fazendo com que as Delegacias de Polícia que não tem essa atribuição, também custodiem detentos diversos sem as mínimas condições físicas ou adequadas para comportar por vezes mais de 12 indivíduos numa pequena cela que seria destinada para dois ou três presos provisórios.
Por falta de Cadeias ou Presídios adequados e por falta de espaço físico todos os presos moram no mesmo pavilhão, na mesma ala ou na mesma cela, independente da natureza do seu delito, e por vezes, independente de ser condenado ou processado. A mídia, de quando em vez mostra as condições miseráveis em que vivem os detentos na grande maioria das Unidades Prisionais do Brasil, e fala também dessa questão do estuprador quando da sua permanência em cárcere que já se tornou pública e notória sua condição.
Assim também, o autor do crime de estupro, o estuprador, mesmo antes de ser julgado, mesmo antes de ser condenado, mesmo antes de ser considerado culpado, mesmo antes do trânsito em julgado da sua sentença condenatória, no calor dos fatos, no trâmite do seu processo, às vezes até em fase de Inquérito Policial, por falta de opção e adequação, é colocado em meio a criminosos diversos, e em conseqüência, pela praxe antiga ou prática usual dos presos quanto a esse tipo de delinqüente, é molestado sexualmente, é usado sexualmente à força, é estuprado na verdadeira expressão da palavra (de acordo com a nova concepção do crime de estupro), configurando assim a pena de Talião dentro do Estado Democrático de Direito, por falha absoluta do Estado-Custódia.
Para o acusado do crime de estupro que ainda responde a processo e que na verdade é inocente, resta-lhe o trauma eterno e a revolta interminável de uma injustiça sem fim.
Para o acusado do crime de estupro que realmente é culpado, resta-lhe o conformismo de aceitar a condenação de duas penas distintas decorrentes do seu ato criminoso.
Para os estupradores do suposto estuprador, resta-lhes a “glória”, o “respeito”, o “aplauso” dos seus colegas de infortúnio, da população carcerária e também de boa parte do nosso povo que assim entende Justiça feita.
Esses delinqüentes que praticam tal delito idêntico ou pior em nome da Lei de Talião, quase sempre ou nunca responderão a processos ou serão condenados, principalmente por falta absoluta de provas testemunhais, vez que, dentro dos cárceres impera a Lei do silencio sob pena capital ao seu delator, ademais, as próprias vítimas preferem calar-se ao risco de morte certa pela comunidade carcerária em caso exigir providencias das Autoridades constituídas.
Assim, os carrascos de Talião que na verdade cometem o crime de estupro contra os estupradores, e que podem estar condenados a pagar penas inferiores por prática de outros ilícitos, saem ilesos do novo delito e sentem-se os verdadeiros paladinos da Justiça de Talião.
(*Delegado de Polícia no Estado de Sergipe. Pós-Graduado em Gestão Estratégica em Segurança Pública pela UFS).
archimedes-marques@bol.com.br
Referências Bibliográficas e pesquisa em sites:
BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro, 1992.
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Max Limonad Editora, 2000.
COMPARATO, Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva, 2007.
CRETELLA JUNIOR, Jose. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: RT, 2000.
DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. São Paulo: Método, 2003.
MIRABETE, Julio Fabrini: Código Penal Interpretado. Editora Atlas: São Paulo, 2000.
HIUNGRIA, Nelson: Comentários ao Código Penal. Forense: Rio de Janeiro, 1958.
MAXIMINIANO, Antonio Cesar Amauri. Introdução à administração. São Paulo: Atlas, 2007.
MESTIERI, João. Do delito de estupro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982.
AMARAL, Carlos Eduardo Rios do. Do homem como sujeito passivo do delito de estupro (Lei 12.015/2009). Netlegis, 2009.
Enciclopédia Brasileira Mérito. São Paulo: Editora Mérito, 1964.
Biblioteca virtual WIKIPÉDIA / Educaterra/ Vestibular1/ CONJUR/ Historianet/ Netlegis/ Idecrim/ Jusvi/ Novacriminologia/ Rcaadvogados/ Clubjus/ Infodireito/ Jurisway/ Buenoecostanze.adv/ Direitopositivo/ Webartigos/ Jusbrasil.

JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
Ex-CORREGEDOR INTERNO

domingo, 6 de setembro de 2009

RIOCARD - SOLICITE O SEU, ASSIM COMO, OS VALORES NÃO RECEBIDOS.

Na nossa visita à Petrópolis para recepcionar Sérgio Cabral (PMDB) constatamos que os Policiais Militares do 26o BPM não recebem o benefício e procuramos orientá-los.
Todos os Policiais Militares têm o direito de receber esse salário indireto e simultaneamente, portanto requera o seu e requera também os valores não recebidos a contar da data na qual o primeiro Policial Militar passou a receber.
A diferença no tratamento ofende de morte todos os princípios que determinam a isonomia no tratamento dos trabalhadores de uma mesma atividade profissional.
A fundamentação legal é:
- Constituição Federal, Constituição do Estado do Rio de Janeiro, Lei de Remuneração e legislação trabalhista brasileira.
Se o administrator público indeferir o requerimento, reúna um grupo de Policiais Militares e encaminhe um email para o advogado Ricardo Gama, ele se comprometeu a auxiliar nas ações judiciais.
Exija os seus direitos.
Obviamente, os Bombeiros Militares possuem igual direito.
Aproveitamos para agradecer aos novos seguidores: 36bpmsgt Eclésio e Xandy Carneiro.
JUNTOS SOMOS FORTES!
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
Ex-CORREGEDOR INTERNO

quinta-feira, 30 de abril de 2009

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - INSCRIÇÕES PARA ESTÁGIO.

O Ministério Público do Trabalho do Rio de Janeiro abriu vagas para o programa de estágio na área de Direito. As inscrições podem ser feitas até 29 de maio. A prova está marcada para 1º de julho.
Dos 12 candidatos selecionados, 10 trabalharão na própria sede. As outras duas vagas são para as unidades do interior: Campos de Goytacazes e Petrópolis. A bolsa-auxílio mensal é de R$ 700 mais vale transporte. Serão convocados, de imediato, os candidatos aprovados para as unidades do interior. Na capital, as vagas serão preenchidas a partir de agosto. O concurso tem validade de um ano.
Para se inscrever, basta estar cursando a partir do sexto período de Direito e comparecer a um dos locais de inscrição, munido de cópia da carteira de identidade, CPF, duas fotos 3x4, histórico escolar e declaração da instituição de ensino informando o período que está cursando.
Para mais detalhes e ficha de inscrição, acesse o site da
instituição.
Locais de inscrição:
Rio de Janeiro, na Av. Churchill, 94, 7º-11º andares, Centro.
Procuradorias do Trabalho nos Municípios de Campos dos Goytacazes - Rua Gil de Góis, 291 – Centro.
Nova Friburgo - Rua Dr. Ernesto Basílio, 30 Cobertura – Centro.
Volta Redonda - Rua 537, 31 – Jardim Paraíba.
Nova Iguaçu - Rua Rita Gonçalves, 422 – Centro, Nova Iguaçu.
Cabo Frio - Rua Florismundo Batista Machado, 11 – Jardim Machado – Praia do Forte.
Niterói - Rua Visconde do Uruguai, 535 – 7º e 8º andares – Centro.
Petrópolis - Rua São Pedro de Alcântara, 9 - Centro.

PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
CORONEL BARBONO

terça-feira, 14 de abril de 2009

"VIVEMOS NO PAÍS DO BBB..." - MIGUEL REALE JÚNIOR.


No país do BBB, Judiciário é instrumento de paz social
Por David Prado
“Vivemos no país do BBB!..." A exclamação, em tom de lamento, é do advogado, professor, escritor e ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior. "A sociedade está absolutamente desorientada pela grande prevalência dos veículos de comunicação e pelo enfraquecimento dos meios de controle sociais informais.” Para ele, o brasileiro trocou o “sucesso do ideal” para buscar o “ideal do sucesso”.
É nesse contexto que florescem mentalidades como a que ele chama de "ilusão do Direito Penal". "Em anos de eleições, os políticos sempre apresentam projetos absurdos em matéria penal só para poderem dizer no horário eleitoral: 'Eu ajudei a aprovar a Lei de Crimes Hediondos'", exemplifica. Foi assim que surgiram leis como a dos Crimes Hediondos e a Lei Maria da Penha. Outros projetos só não foram à frente por excesso de absurdo: "Já tentaram fazer a Lei de Sequestro de Ônibus e a Lei dos Pais que Atiram os Filhos pela Janela".
Razão para otimismo, só a atuação do Supremo Tribunal Federal, que tem tido sabedoria para preencher os vazios que se abrem na política e na sociedade. "O STF tem assumido um papel quase de ordenador, especialmente da estrutura política". Para isso, a corte tem se valido de institutos como o Mandado de Injunção para suprir omissões do Poder Legislativo.
Quanto ao Judiciário em geral, Reale Júnior lembra que ele é um instrumento de paz e harmonia social. "Onde há juiz existe paz, desde que ele saiba que o seu papel é de conciliação. Ele é autoridade absolutamente respeitável, capaz de impor-se e estabelecer o termo de convivência", diz. A realidade, é verdade, nem sempre corresponde a esse ideal de harmonia. Miguel Reale Júnior lamenta os casos de corrupção nos quais o Judiciário é acusado, e não se conforma com o desvirtuamento de experiências originalmente alvissareiras, como os Juizados Especiais.
Em entrevista à revista Consultor Jurídico, o também escritor Miguel Reale Jr. revela detalhes sobre o seu terceiro romance O Juramento, livro que aborda o conflito geracional entre pais e filhos no interior de Minas Gerais no fim da década de 1940. Presidente do Conselho do Instituto Pro Bono, Reale fala também da importância da advocacia voluntária para a sociedade. “A advocacia pro bono é um ônus que o profissional tem, um dever social, que só honra a advocacia”. Na entrevista, o jurista defende uma reforma no Código Penal e fala do legado deixado por seu pai, o jurista Miguel Reale, para o Direito brasileiro.
Participaram da entrevista os jornalistas Aline Pinheiro e Mauricio Cardoso.
Leia a entrevista:
ConJur — O que o leitor pode esperar do seu mais novo livro, o romance O Juramento? Miguel Reale Jr. — Este é o meu terceiro romance, mas não policial, como os anteriores. O Juramento também se situa no passado mais distante, em 1948, na cidade mineira de Pouso Alegre. Entre os principais dados de realidade histórica que a obra traz está a de que Pouso Alegre foi o único lugar no Brasil a ter um campo de prisioneiros de guerra. Eram prisioneiros alemães que tinham sido detidos depois de aportar em águas brasileiras. O romance relata um confronto de valores entre a geração do século XIX e meados do século XX, e seus filhos. Uma família tradicional mineira, Paiva Lisboa, enfrenta novas formas de vida. O livro demonstra que mesmo numa sociedade tradicional e com padrões religiosos, não há um segredo na transmissão de valores e de comportamento para os filhos. A família vive então uma grande decepção com seus herdeiros. Há um confronto de valores porque há um filho homossexual, outro viciado em drogas e outro comunista. Marca o surgimento de uma nova mentalidade, novas manifestações de liberdade que vão de encontro aos valores tradicionais da aristocracia rural.
ConJur — Pode-se fazer alguma relação aos tempos de hoje? Miguel Reale Jr. — É um pouco difícil, já que vivemos hoje em uma sociedade em radical mudança. Na década de 50, a sociedade ainda estava se instalando. Houve uma transformação fundamental, houve mudanças, uma grande evolução. Essa transformação começa nos anos 50, no pós-guerra, e alcança o seu ápice na geração dos anos 60, especialmente em 1968, que é a grande transformação da libertação sexual, da afirmação da mulher, do processo mais galopante da industrialização, da urbanização. E hoje mudou muito. Vivemos uma mudança mais grave, que é a desordenação da sociedade. Ela está absolutamente desorientada pela grande prevalência dos veículos de comunicação e pelo efetivo enfraquecimento dos meios de controle social informais.
ConJur — Como o senhor define a sociedade hoje?Miguel Reale Jr. — Nós vivemos em uma sociedade de receio, de paúra, de incomunicabilidade, de antissocialidade. As pessoas não participam mais dos problemas dos outros, não se cumprimentam nos elevadores, são indiferentes, têm medo. Essa tão propalada sociedade do risco vive um imenso individualismo, momento em que se passou do “sucesso do ideal para o ideal do sucesso”. As pessoas não têm mais o ideal, só buscam o sucesso. Os referenciais que nós temos hoje são as celebridades criadas pelos meios de comunicação. Nós estamos no país BBB, do presidente da República BBB. Só presidente BBB lança camisinha do palanque carnavalesco. Uma sociedade imensa que, a partir dos anos 50, passou a questionar os controles sociais — a família, a igreja, a escola, o sindicato, o clube, a própria sociedade como um todo — que antes eram inquestionáveis. Estes instrumentos de controle foram contestados ao longo do tempo como no “É Proibido Proibir”, que aborda a liberdade sexual e a afirmação feminina. Mas hoje não existe absolutamente referencial valorativo. A crise de hoje é muito mais profunda porque não existem referenciais. Não há desenvolvimento da personalidade como havia na geração de 68. O jovem afirmava o seu modo de ser e isso significava autonomia. Hoje perdeu-se a capacidade de autonomia.
ConJur — De que maneira a sociedade de hoje influencia o Judiciário?Miguel Reale Jr. — O Judiciário está dentro da sociedade. O Judiciário hoje, infelizmente, está muito envolvido moralmente com a corrupção. Isso conforme dados passados pelo próprio corregedor-geral do Conselho Nacional de Justiça. Corrupção no Espírito Santo, no Maranhão, no Piauí, na Bahia, no próprio Superior Tribunal de Justiça, e com níveis preocupantes nas justiças estaduais. Numa sociedade de medo, em que esses controles sociais não mais funcionam, as pessoas se perguntam: “Como é que eu vou ter segurança”? E a segurança cai na vala comum do Direito Penal. Como existe um vício brasileiro de imaginar que a realidade se revolve pela lei, passamos a ter uma criação vertiginosa de leis penais que têm valor meramente simbólico. Como se os brasileiros pudessem dizer: “Ah, já que existe uma lei penal, eu vou dormir tranquilo”, o que é uma mentira.
ConJur — De que forma podemos observar essa desorganização da sociedade brasileira?Miguel Reale Jr. — A sociedade é politicamente desorganizada. Não existe um centro de poder que imponha respeito. O próprio presidente faz do comportamento educacional baixo um modo de se fazer popular. Ele não transmite comportamentos. O Senado não transmite comportamentos, a Câmara dos Deputados não transmite comportamentos. Passa a ter um papel fundamental o Supremo Tribunal Federal, que fica preenchendo vazios.
ConJur — Qual é o papel do STF nesse vazio da sociedade?Miguel Reale Jr. — Ao contrário do que se estabeleceu durante muitos anos, o STF tem assumido um papel quase de ordenador, especialmente da estrutura política. Eu fiz um dos primeiros Mandados de Segurança de Inconstitucionalidade por Omissão. A Constituição estabelecia em 70 o número máximo de deputados por estado, dependendo de Lei Complementar. São Paulo era o único que poderia ter 70 deputados. Entrei com Mandado de Injunção para que o Supremo legislasse na ausência da atividade legislativa para conceder as cadeiras para São Paulo. Perdi por seis a cinco, mas o Supremo recomendou ao Congresso que legislasse. O Congresso não legislou e entrei com uma Reclamação quanto à ordem judicial. O Supremo também não legislou, mas fez uma outra reprimenda, que levou o Congresso a criar a Lei Complementar que deu 70 lugares de representação para São Paulo na Câmara. O Supremo tinha muito cuidado e dizia “não vou legislar, não vou interferir em outro campo”, numa medida que era claramente uma omissão do Congresso. Agora vêm o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo e legislam em matéria constitucional, como por exemplo, na questão da fidelidade partidária, que impõe a perda do mandato, como está previsto na Constituição. São matérias da reforma política que o Legislativo não faz e que o Supremo achou que deveria fazer.
ConJur — O Supremo não está indo além de suas atribuições?Miguel Reale Jr. — O STF está indo além de suas funções porque criou-se um vazio. Ele não iria além se houvesse uma atuação responsável do Congresso Nacional, que não produz nada de relevante. O Congresso produz medidas provisórias e algumas leis penais, sempre dentro daquela mentalidade da ilusão penal. Quando fui ministro da Justiça, meu grande trabalho em ano eleitoral era impedir que se votassem projetos de leis penais, tamanho eram os absurdos das propostas. Não há ano eleitoral que resista ao aparecimento de normas penais de grande apelo para que depois os deputados, gloriosamente, possam dizer no horário eleitoral “olha, eu participei da elaboração da lei que puniu tal coisa”. É uma ilusão imaginar que leis mais rigorosas vão reduzir a criminalidade.
ConJur — O Direito Penal pode ser considerado instrumento de segurança pública?Miguel Reale Jr. — Tanto o governo federal como o Congresso são indiferentes a qualquer política criminal de cunho social. Isso estava num diagnóstico do sistema criminal de uma comissão que eu presidi em 2000, com várias propostas de política criminal, que não foram postas em prática. Porque reina sempre a lei do mínimo esforço. “Ah, existe um problema? Então vamos criar a lei penal”. Em 2002 foi criada no Congresso uma Comissão Mista de Segurança Pública, de onde saíram os maiores absurdos. Um deles nasceu com o sequestro do ônibus 174, fato que rendeu um filme que quase foi indicado ao Oscar. Na época, a Câmara dos Deputados ganhou o Oscar da imbecibilidade. Foi criado um projeto de lei, do qual eu consegui segurar a votação, que tipificava o “sequestro de ônibus” com pena mínima de 20 anos. Recentemente, criaram a figura de matar o filho jogando pela janela, por causa do caso Nardoni.
ConJur — O Congresso acaba de aprovar a lei do sequestro-relâmpago. Há necessidade de aprovar leis para tipificar crimes tidos como novos? Miguel Reale Jr. — Eu fiz parte da comissão que criou a figura do sequestro-relâmpago. Pode-se até criticar a descrição, mas já existe e tem pena elevada.
ConJur — A pena, agora, pode chegar a 30 anos.Miguel Reale Jr. — Trinta? Isso é jogar para a platéia.
ConJur — A Lei dos Crimes Hediondos foi oportuna?Miguel Reale Jr. — A Lei dos Crimes Hediondos foi o maior blefe que já houve neste país. As fontes legislativas no Brasil são: a lei, a doutrina, a jurisprudência e a televisão. Em 1990, às vésperas do processo eleitoral, foi sequestrado Roberto Medina, jornalista de conhecida rede televisiva. Em função do sequestro, cria-se a Lei dos Crimes Hediondos e se estabelece o rigor na execução da pena. O que aconteceu depois de 1990? Multiplicou-se por dez o número de sequestros no Rio [de Janeiro]. Então não é a lei penal. Essa lei é inconstitucional porque impede o cumprimento individualizado da pena e a progressão de regime. Mas o Supremo, na época, entendeu que não era inconstitucional. Então foi criada uma comissão e nós propusemos uma outra legislação chamada Crimes de Especial Gravidade em que se estabelecia a progressão — mais rigorosa do que está no Código Penal, que é tênue demais.
ConJur — Como esse projeto foi avaliado pelo Legislativo?Miguel Reale Jr. — O texto iria para votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. O Antônio Carlos Magalhães, que presidia a CCJ [Comissão de Constituição e Justiça], viu naquilo benefícios aos outros criminosos do país. O caso foi parar no Jornal Nacional e houve um "estrondo" no país. A tal ponto que, erradamente, o governo se acovardou e retirou o projeto. Muda a composição do Supremo e, por maioria, os ministros dizem que a Lei dos Crimes Hediondos é inconstitucional e determinam que não poderia haver a proibição de passagem de um sistema rigoroso para outro menos rigoroso e também proibiram o cumprimento da pena integral em sistema fechado. Nessa hora, todos os juízes que decidiram em contrário passaram a decidir em função de um voto de uma decisão em Habeas Corpus e não por Arguição de Inconstitucionalidade. Se é inconstitucional a norma da Lei dos Crimes Hediondos, vai se aplicar o quê? Código Penal comum, que é muito tênue. Aí vem o Congresso e aprova o projeto que nós tínhamos feito. É piada ou não é? Posso acreditar nesse país? Posso levar a sério esse Congresso?
ConJur — A Lei Maria da Penha também produziu efeitos contrários aos que se propunha?Miguel Reale Jr. — Acaba de sair um estudo de uma juíza do Rio Grande do Sul — eu já tinha escrito isso — concluindo que a Lei Maria da Penha acabou tendo um efeito perverso. Copiaram a normativa de uma lei espanhola e não perceberam qual seria o efeito. Qual foi o efeito dessa lei? Ela reduziu o número de denúncias e de fatos. As mulheres deixaram de denunciar seus maridos ou companheiros porque sabem que a denúncia é irreversível e é difícil de retornar. Elas não querem pôr o marido na cadeia, só querem que cesse a agressão. Então reduziu o número de comunicações e isto também por causa da má aplicação da lei pelos juizados especiais criminais. Virou piada.
ConJur — O Código Penal precisaria de uma reforma?Miguel Reale Jr. — Sim. Até tenho um projeto de lei que precisa de uma comissão para reordenar a parte geral de 1984. Esse projeto está parado na Câmara há um bom tempo. A parte geral foi alterada no sistema de penas pela Lei 9.914. Foi uma coisa horrorosa. Essa lei cria etnomias absurdas que envergonham a legislação brasileira no plano internacional. A parte especial já é mais complicada. Precisa fazer uma consolidação das leis penais porque não existe lei no país que não tenha uma disposição penal. Nenhum deputado fica satisfeito de elaborar uma lei que não traga uma previsão de crime. Tudo vira crime. Então passa a haver crimes de comportamento. Meras desobediências administrativas ou a regulamentos são criminalizadas.
ConJur — Há um excesso de leis penais?Miguel Reale Jr. — O trabalho mais difícil é o de consolidação da legislação penal extravagante brasileira. Tem lei penal para todo o lado, com penas absolutamente desproporcionais. Exemplo clássico ocorreu no ano eleitoral de 1998, quando surgiu o caso dos “bebês Shering”, cujas mães tomaram pílula de farinha no lugar de anticoncepcional. Grandes matérias nos jornais televisivos falavam sobre falsificação de remédios. O que fazem? Uma nova lei dos remédios. Mudam o Código Penal e estabelecem pena de 10 a 15 anos para adulteração de remédio. Crime hediondo. Tinha que ser, afinal de contas estávamos às vésperas da eleição.
ConJur — A lei abrange cosméticos também, não é?Miguel Reale Jr. — Vender um shampoo com fórmula diferente daquela escrita na Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] virou crime hediondo com pena de 10 a 15 anos. O shampoo pode ser melhor, mas como a fórmula não é a inscrita na Anvisa, é crime hediondo. Lembro-me de tantos deputados que compareciam com suas manifestas inteligências no horário eleitoral dizendo: “Eu participei da elaboração da lei que transforma falsificação de remédio em crime hediondo”.
ConJur — Isso acontece também no caso da lei ambiental?.Miguel Reale Jr. — A lei ambiental é um desastre. É a legislação mais envergonhante do Direito brasileiro. Eu a chamei de a “lei hedionda dos crimes ambientais”. É uma coisa ridícula que transforma vários crimes de comportamento em crime de desobediência. Quer dizer: deixar de respeitar um regulamento no uso de agrotóxicos é crime. Dano culposo indireto. Maltrato a plantas ornamentais tem a forma culposa. Se você escorrega e amassa a begônia do jardim do vizinho é crime.
Conjur — Um membro do Conselho Nacional de Justiça diz que as leis são produzidas, caem no limbo e só se efetivam depois que passam pelo crivo do Judiciário. O senhor concorda? Miguel Reale Jr. — A lei é eficiente quando não é desrespeitada. Nesse caso, nem precisa ser apreciada pelo Judiciário. Evidentemente que toda lei está sujeita à interpretação. A vontade do legislador é desfeita porque a lei ganha vida própria, a lei tem a sua autonomia. O Direito é o que a interpretação for, isso é um princípio internacional. E a interpretação não está apenas na letra. Ela se faz na relação entre a lei e o fato concreto em exame. É o Judiciário que em parte vai examinar a contribuição da doutrina na aplicação ao fato concreto. E como a realidade é muito mais rica do que a lei, a realidade traz novidades sempre que a aplicação vai além daquilo que a norma diz.
ConJur — Qual a sua avaliação da atuação dos juizados especiais? Miguel Reale Jr. — Ainda continua a haver no Brasil as audiências coletivas de juizados especiais. São 400 pessos chamadas na mesma audiência que parece um verdadeiro mercado. O juiz vai lá e faz uma conversa assim.“Olha, vocês são boas pessoas, vocês foram honestos sempre. Cometeram um pequeno erro, a Justiça vai compreender. Nós vamos perdoar. Quem concorda em pagar uma cesta básica?" O incrível é que o acordo ocorre mesmo que haja erro na autoria do crime ou em casos em que não há crime. E o juiz diz “isso é pra depois, isso não interessa”. Muitos advogados também concordando porque eles ganham para acompanhar o cliente na audiência. E os juízes querem resolver o acúmulo de processos.
ConJur — É possível conciliar e fazer justiça com celeridade?Miguel Reale Jr. — É possível conciliar desde que exista mentalidade para tanto. Existem juízes que sabem que estão lá para compor, promotores que sabem que tem que se fazer uma seleção. Mas via de regra, o que há é uma burocratização da Justiça, uma ausência de dedicação. É massa de trabalho: números que eu tenho que resolver, gavetas e estantes que eu tenho que esvaziar. A que preço, não importa. O problema não é processual, é social. E não encaram que por trás do processo existe gente, existe um drama, existe um conflito. Esta é uma visão positivista, processualista, que herdamos dos nossos fundadores portugueses.
ConJur — Mas o papel de resolver os problemas não é do Judiciário?Miguel Reale Jr.— É, na medida em que o Judiciário é o grande instrumento de paz social, de harmonia social. Organizei no Ministério da Justiça os “plantões sociais” nas delegacias de polícia, com psicólogos e assistentes sociais. O Judiciário tem que ser auxiliado por estes profissionais, este é seu papel. Onde há juiz, existe paz desde que ele saiba que o seu papel é de conciliação. Ele é a autoridade absolutamente respeitável que é capaz de impor-se e estabelecer o termo de convivência.
ConJur — Qual seria o prazo razoável de tramitação de um processo?Miguel Reale Jr. — Não existe o prazo razoável do processo. O processo exige uma complexidade de provas, de elementos de análise de busca de documentos, de análises periciais. Então tem vários problemas sérios de perícia que muitas vezes demandam tempo. O que não é razoável é que o processo fique quatro anos para ser distribuído no Tribunal de Justiça. Porque ali não está sendo feito prova. Ele está parado.
ConJur — Como é que o senhor avalia o trabalho do CNJ?Miguel Reale Jr. — O Conselho Nacional de Justiça, contra o qual a magistratura se colocou tão ardorosamente tem um papel fundamental. Durante a Constituinte acreditva-se que um órgão de controle traria a destruição do Judiciário. Hoje a própria AMB [Associação dos Magistrados Brasileiros] reconhece que precisa de um órgão de controle. Porque a corrupção contaminou grande parte do Judiciário brasileiro. O nepotismo é um exemplo muito claro. Já está previsto na Constituição quando ela diz que tem que haver o respeito ao princípio da impessoalidade. Depois veio a Lei dos Servidores Judiciários e Federais de 1996 [Lei 11.416/06], que proibiu o nepotismo. E não era cumprida. Agora tem a Portaria 4 do CNJ que proibiu essa prática.
ConJur — O economista Albert Fishlow diz que a estabilidade econômica e política do Brasil foi mais obra do Judiciário do que do Executivo e do Legislativo. O senhor concorda?Miguel Reale Jr. — O Judiciário, depois da Constituição de 1988, sofreu uma imensa demanda. Havia uma litigiosidade contida. Mas, ao mesmo tempo, tem um dado assustador: o Judiciário brasileiro é dos Judiciários do mundo que tem o maior número de processos, mas é o que tem o menor número de partes. As partes são as grandes corporações, as grandes empresas, ou o Estado, seja a União, os estados e os municípios, que açambarcam 80% do Judiciário. Então, a maior parte da população não tem acesso ao Judiciário.
ConJur — Mas o juizado especial foi criado com a ideia de ampliar o acesso à Justiça.Miguel Reale Jr. — Foi criado com essa ideia e funciona. O juízo cível especialmente tem funcionado bem. Alguns da Justiça criminal até funcionam, mas a maioria tem se transformado numa “fábrica de soluções rápidas legais”. Mas, agora, não sei por quê, o Judiciário virou fonte de segurança jurídica. As decisões dos tribunais dão segurança jurídica ao investidor e os agentes econômicos querem essa segurança. Mas, ao mesmo tempo, essa segurança jurídica é sempre uma reclamação dos empresários. Primeiro porque há uma demora no processo judicial imensa. Depois porque existe a criação legislativa. O Judiciário não consegue suprir tudo isso.
ConJur — As mudanças da composição, principalmente no Supremo, prejudicam a segurança jurídica?Miguel Reale Jr. — Não, acho até que ela areja. Sou até defensor de um mandato de nove anos para ministro do Supremo Tribunal Federal. Exatamente para arejar, para mudar, é fundamental. E tem mudado, às vezes, para muito melhor.
ConJur — O senhor é presidente do conselho do Instituto Pro Bono. Qual a importância da advocacia voluntária no país?Miguel Reale Jr. — A advocacia Pro Bono enfrentou uma série de reações dos que achavam que seria uma forma de captar clientela. O Instituto Pro Bono dedica-se a fazer advocacia gratuita com vários escritórios. Temos mais de 300 escritórios que estão inscritos para a produção de trabalhos jurídicos consultivos ou contenciosos. O trabalho é prestado a entidades assistenciais sem fins lucrativos que têm problemas tributários, trabalhistas ou comerciais.
ConJur — Como o senhor avalia a posição da Ordem dos Advogados do Brasil em relação à advocacia voluntária?Miguel Reale Júnior — Existe um projeto sobre advocacia voluntária que está em tramitação no Conselho Federal da OAB. Existem várias decisões, regulamentos de OABs estaduais aprovando a advocacia voluntária. Existe também o receio de que haja perda do mercado de trabalho porque muitos advogados sobrevivem graças ao convênio de Assistência Judiciária com o estado. Houve um grande crescimento de faculdades de Direito e, mesmo com Exame de Ordem, acabou havendo uma proletarização da profissão. Mas isso não proíbe que exista advocacia pro bono porque é um ônus que o profissional tem, um dever social, que só honra a advocacia.
ConJur — Qual foi o legado de seu pai, o jurista Miguel Reale, para o Direito Brasileiro? Quais foram suas principais contribuições?
Miguel Reale Jr. — O legado principal foi, sem dúvida nenhuma, o novo Código Civil, que recebeu muitas críticas, mas depois se percebeu o quanto é inovador e criativo. A busca de flexibilidade para adaptação a situações novas, por meio de cláusulas abertas, demonstra como ele é moderno. Outra grande contribuição foi no ensino do Direito. O livro dele sobre anulamento e revogação do ato administrativo, é um clássico. Lições Preliminares do Direito e A Filosofia do Direito, por exemplo, continuam a ser livros básicos adotados por inúmeras faculdades. Outra contribuição importante foi a criação do Instituto Brasileiro de Filosofia e a edição da Revista Brasileira de Filosofia, que já consta com mais de 200 números. São 54 anos ininterruptos da publicação.
ConJur — Como era o pensamento dele sobre o Direito?Miguel Reale Jr. — Ele foi um dos últimos jurisconsultos do Brasil, um filósofo do Direito. Foi um administrativista, constitucionalista e civilista, inclusive no Direito Privado. Ele tinha uma ampla gama de conhecimentos em diversas áreas. Atuava tanto no campo público como no privado, o que é extremamente raro numa época de especializações. Ele tinha também uma visão culturalista muito importante. A ideia de cultura como uma priori, ou seja, o homem é natureza, mas é, antes de tudo, História. Estou criando um Instituto de Estudos Culturalistas em homenagem ao pensamento dele.
ConJur — Miguel Reale é renomado pela compreensão tridimensional do Direito. Qual sua opinião sobre essa visão? Miguel Reale Jr. — É uma visão integrada, concreta e realista, que revela a nomogênese jurídica, ou seja, o processo da formação do Direito. E esse processo de formação por meio da Teoria Tridimensional é completada pela visão das fontes e modelos legais, consuetudinários, negociais, judiciais para chegar a uma outra contribuição importante no campo da teoria da interpretação. Ela revela especialmente a ideia de que o Direito é o que a interpretação for e que este está condicionado pela cultura e pela História. Não se pode ter uma visão exclusiva da teoria tridimensional sem a compreensão da construção dos modelos e de fontes de modelos. No livro Fontes e Modelos, ele amplia e mostra que o Direito vem de diversos focos de poder, que estão sempre condicionados por circunstâncias concretas e históricas.
PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
CORONEL BARBONO

segunda-feira, 23 de março de 2009

O STJ, A LEI MARIA DA PENHA E A AÇÃO PENAL NAS LESÕES LEVES - RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA - PROCURADOR DE JUSTIÇA.

O STJ, A LEI MARIA DA PENHA E A AÇÃO PENAL NAS LESÕES LEVES - UMA NOVA ORIENTAÇÃO[1]

O Superior Tribunal de Justiça havia decidido meses atrás que autores de violência doméstica contra mulheres podiam ser processados pelo Ministério Público, independentemente de autorização da vítima. A conclusão, por maioria, foi da Sexta Turma, ao considerar que a ação penal contra o agressor deve ser pública incondicionada. No recurso especial dirigido ao STJ, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios protestava contra o trancamento da ação penal contra o agressor E.S.O., do Distrito Federal. Após a retratação da vítima em juízo, afirmando não querer mais perseguir criminalmente o agressor, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios trancou a ação, afirmando que não haveria justa causa para o seu prosseguimento. Segundo o TJDFT, os delitos de lesões corporais leves e culposas continuam tendo a natureza jurídica de pública condicionada à representação, pois o sistema processual brasileiro tem regência da unicidade. “Não havendo a possibilidade jurídica para o prosseguimento da ação penal, em face das disposições do artigo 16 da Lei ‘Maria da Penha’, qual seja, a manifestação da vítima perante o juiz de não mais processar o seu companheiro, concede-se a ordem de habeas corpus para determinar-se o trancamento da ação penal por faltar-lhe a justa causa”, afirmou a decisão do TJDFT. Na decisão, o tribunal brasiliense ressalvou, ainda, a possibilidade de a vítima, a qualquer momento, no prazo de seis meses, voltar a exercer o direito de denunciar o agressor. Para o Ministério Público, no entanto, a decisão ofendeu os artigos 13, 16 e 41 da Lei Maria da Penha, além dos artigos 648, I, e 38 do Código de Processo Penal, artigo 88 da Lei n. 9.0909/95 e os artigos 100 e 129, parágrafo 9, do Código Penal. Requereu, então, a reforma da decisão, alegando que a ação penal do presente delito tem natureza pública incondicionada, não sendo dependente da representação da vítima. Em parecer sobre o caso, o Ministério Público Federal observou que a Lei Maria da Penha prescreve, em seu artigo 41, que não se aplica a Lei n. 9.099/95 aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher. Segundo o Ministério Público Federal, deve ser reconhecido o direito do Estado em dar prosseguimento à ação penal, vez que esta não depende de representação da vítima, devendo ser reconhecida a justa causa para a perseguição criminal do agressor. A relatora do caso, a Desembargadora convocada Jane Silva, concordou com os argumentos e foi acompanhada pelo Ministro Paulo Gallotti. Os Ministros Nilson Naves e Maria Theresa de Assis Moura divergiram. Em seu voto-vista, o Ministro Og Fernandes desempatou em favor da tese do Ministério Público: a ação contra autores de violência doméstica contra a mulher deve ser pública incondicionada. O mesmo resultado foi adotado para o Recurso Especial 1.050.276, também do Distrito Federal.
No entanto, em sessão realizada no dia 05 de março, o Superior Tribunal de Justiça decidiu contrariamente: “A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus, mudando o entendimento quanto à representação prevista no art. 16 da Lei n. 11.340/2006. Considerou que, se a vítima só pode retratar-se da representação perante o juiz, a ação penal é condicionada. Ademais, a dispensa de representação significa que a ação penal teria prosseguimento e impediria a reconciliação de muitos casais.” (
HC 113.608-MG, Rel. originário Min. Og Fernandes, Rel. para acórdão Min. Celso Limongi - Desembargador convocado do TJ-SP, julgado em 5/3/2009).
Entendemos absolutamente acertada esta última decisão e esperamos que passe a ser um importante precedente na própria Corte.
Como se sabe, o art. 41 da Lei Maria da Penha determina que “aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a
Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.” Logo, em uma interpretação puramente literal, seria inaplicável o art. 88 da Lei nº. 9.099/95; logo, o crime de lesões corporais leves seria de ação penal pública incondicionada, quando praticado no contexto de violência doméstica ou familiar.
Obviamente que se trata de artigo inconstitucional, pois são maculados os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade
[2]. Assim, ainda que se trate de uma lesão corporal leve, deve ser observado o art. 88, além das demais medidas despenalizadoras previstas na Lei nº. 9.099/95 (composição civil dos danos, transação penal e suspensão condicional do processo, bem como a medida “descarcerizadora” do art. 69).
Cremos que devemos interpretar tal dispositivo à luz da Constituição Federal e não o contrário. Afinal de contas, como já escreveu Cappelletti, “a conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todas.”
[3] Devemos interpretar as leis ordinárias em conformidade com a Carta Magna, e não o contrário! Segundo Frederico Marques, a Constituição Federal “não só submete o legislador ordinário a um regime de estrita legalidade, como ainda subordina todo o sistema normativo a uma causalidade constitucional, que é condição de legitimidade de todo o imperativo jurídico.”[4]
A prevalecer a tese contrária, em uma lesão corporal leve praticada contra uma mulher a ação penal independe de representação (é pública incondicionada), mas uma lesão corporal leve cometida contra um infante ou um homem de 90 anos depende de representação. Outro exemplo: um pai agride e fere levemente seus dois filhos gêmeos, um homem e uma mulher; receberá tratamento jurídico-criminal diferenciado. Onde nós estamos!
Evidentemente que o princípio da proporcionalidade não foi observado, o que torna inválida esta norma, apesar de vigente. Como observa Mariângela Gama de Magalhães Gomes, este princípio “desempenha importante função dentro do ordenamento jurídico, não apenas penal, uma vez que orienta a construção dos tipos incriminadores por meio de uma criteriosa seleção daquelas condutas que merecem uma tutela diferenciada (penal) e das que não a merecem, assim como fundamenta a diferenciação nos tratamentos penais dispensados às diversas modalidades delitivas; além disso, conforme enunciado, constitui importante limite à atividade do legislador penal (e também do seu intérprete), posto que estabelece até que ponto é legítima a intervenção do Estado na liberdade individual dos cidadãos.”
[5]
Para Pedraz Penalva, “a proporcionalidade é, pois, algo mais que um critério, regra ou elemento técnico de juízo, utilizável para afirmar conseqüências jurídicas: constitui um princípio inerente ao Estado de Direito com plena e necessária operatividade, enquanto sua devida utilização se apresenta como uma das garantias básicas que devem ser observadas em todo caso em que possam ser lesionados direitos e liberdades fundamentais.”
[6]
Na lição de Sebástian Melo, “sendo o Direito Penal um instrumento de realização de Direitos Fundamentais, não pode prescindir do princípio da proporcionalidade para realização de seus fins. Esse princípio, mencionado com destaque pelos constitucionalistas, remonta a Aristóteles, que relaciona justiça com proporcionalidade, na medida em que assevera ser o justo uma das espécies do gênero proporcional. Seu conceito de proporcionalidade repudia tanto o excesso quanto a carência. A justiça proporcional, em Ética e Nicômaco é uma espécie de igualdade proporcional, em que cada um deve receber de forma proporcional ao seu mérito. Desta forma, para Aristóteles, a regra será justa quando seguir essa proporção. Nas palavras do filósofo grego em questão, a sua igualdade proporcional representa uma ´conjunção do primeiro termo de uma proporção com o terceiro, e do segundo com o quarto, e o justo nesta acepção é o meio-termo entre dois extremos desproporcionais, já que o proporcional é um meio termo, e o justo é o proporcional´.”[7]
Lembremos, com Humberto Ávila, que a igualdade (que ele denomina de postulado) “estrutura a aplicação do Direito quando há relação entre dois sujeitos em função de elementos (critério de diferenciação e finalidade da distinção) e da relação entre eles (congruência do critério em razão do fim).” Para ele, a proporcionalidade (que também seria um postulado) “aplica-se nos casos em que exista uma relação de causalidade entre um meio e um fim concretamente perceptível. A exigência de realização de vários fins, todos constitucionalmente legitimados, implica a adoção de medidas adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito.”
[8]
O princípio da igualdade, previsto expressamente no art. 5º., caput da Constituição Federal, “significa a proibição, para o legislador ordinário, de discriminações arbitrárias: impõe que a situações iguais corresponda um tratamento igual, do mesmo modo que a situações diferentes deve corresponder um tratamento diferenciado.” Segundo ainda Mariângela Gama de Magalhães Gomes, a igualdade “ordena ao legislador que preveja com as mesmas conseqüências jurídicas os fatos que em linha de princípio sejam comparáveis, e lhe permite realizar diferenciações apenas para as hipóteses em que exista uma causa objetiva – pois caso não se verifiquem motivos desta espécie, haverá diferenciações arbitrárias.”[9]
Para Ignacio Ara Pinilla, “la preconizada igualdad de todos frente a la ley (...) ha venido evolucionando en un sentido cada vez más contenutista, comprendiédose paulatinamente como interdicción de discriminaciones, o, por lo menos, como interdicción de discriminaciones injustificadas.”[10]
Como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, “há ofensa ao preceito constitucional da isonomia quando a norma singulariza atual e definitivamente um destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas, ou uma pessoa futura e indeterminada.”
[11]
Mas, infelizmente, como afirma Francesco Palazzo, “a influência dos valores constitucionais vem, pouco a pouco, crescendo sempre no arco dos tempos, sem que, no entanto, ainda assim as transformações constitucionais tenham logrado produzir a esperada reforma orgânica do sistema penal, inclusive.”[12]
Canotilho explica que são “princípios jurídicos fundamentais os princípios historicamente objectivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma recepção expressa ou implícita no texto constitucional. Pertencem à ordem jurídica positiva e constituem um importante fundamento para a interpretação, integração, conhecimento e aplicação do direito positivo.”[13]
Diante do exposto, este dispositivo da nova lei não deve ser aplicado pelo Juiz, pois, como se sabe, o controle de constitucionalidade judiciário no Brasil tem o caráter difuso[14], podendo “perante qualquer juiz ser levantada a alegação de inconstitucionalidade e qualquer magistrado pode reconhecer essa inconstitucionalidade e em conseqüência deixar de aplicar o ato inquinado”, na lição do constitucionalista Manoel Gonçalves Ferreira Filho.[15]

[1] Rômulo de Andrade Moreira é Procurador de Justiça na Bahia. Foi Assessor Especial do Procurador-Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador-UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). É Coordenador do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal da UNIFACS. Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador-UNIFACS (Curso coordenado pelo Professor J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais e do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim e ao Movimento Ministério Público Democrático. Integrante, por duas vezes consecutivas, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação da Universidade Federal da Bahia, do Curso JusPodivm, do Curso IELF, da Universidade Jorge Amado e da Fundação Escola Superior do Ministério Público. Autor das obras “Direito Processual Penal”, “Comentários à Lei Maria da Penha” (em co-autoria) e “Juizados Especiais Criminais”– Editora JusPodivm, 2008, além de organizador e coordenador do livro “Leituras Complementares de Direito Processual Penal”, Editora JusPodivm, 2008. Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados na Bahia e no Brasil.
[2] É cediço que o princípio da proporcionalidade está implícito na Constituição Federal. Os princípios implícitos, como se sabe, “podem ser apreendidos a partir de uma pluralidade, mais ou menos vasta, de normas explícitas, ou ainda ser extraídos não mais de uma pluralidade de disposições, mas de uma única disposição. Isso se dá toda vez que de uma única disposição se extrai, além da norma expressa que constitui seu significado, também uma norma ulterior implícita. Finalmente, restam aqueles princípios totalmente implícitos, que são deduzidos não de uma disposição, mas da ´natureza das coisas`, da ´Constituição material`, do sistema jurídico como um todo, de outros princípios implícitos à sua volta, e assim por diante.” Quanto à proporcionalidade, “sua natureza de princípio jurídico é evidenciada quando, à parte da generalidade e do aspecto vago do que impõe (...), é possível também verificar que se encontra entre as normas superiores do ordenamento jurídico, de nível constitucional, razão pela qual norteia toda a atividade penal, seja no âmbito legislativo, seja na aplicação da lei aos casos concretos.” (Mariângela Gama de Magalhães Gomes, “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 58, com grifo nosso).
[3] Apud José Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.
[4] Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 79.
[5] O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 59.
[6] Apud Mariângela Gama de Magalhães Gomes, “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 60.
[7] “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, texto inserto na obra Princípios Penais Constitucionais, Salvador: Editora JusPodivm, 2007, p. 203.
[8] Teoria dos Princípios, São Paulo: Malheiros, 4ª. ed., 2004, p. 131.
[9] Obra citada, p. 67.
[10] “Reflexiones sobre el significado del principio constitucional de igualdad”, artigo que compõe a obra coletiva denominada “El Principio de Igualdad”, coordenada por Luis García San Miguel, Madri: Dykinson, 2000, p. 206.
[11] Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, São Paulo: Malheiros, 1999, 3ª. ed., 6ª. tiragem, p. 47.
[12] Valores Constitucionais e Direito Penal, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1989, p. 117.
[13] Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra: Almedina, 6ª. ed., p. 1.151.
[14] Segundo José Afonso da Silva, entre nós, este “sistema foi originariamente instituído com a Constituição de 1891 que, sob a influência do constitucionalismo norte-americano, acolhera o critério de controle difuso por via de exceção, que perdurou nas constituições sucessivas até a vigente.” (Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: Malheiros, 10ª. ed., 1995).
[15] Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 17ª. ed., 1989, p. 34.


PAULO RICARDO PAÚL
CORONEL DE POLÍCIA
CORONEL BARBONO