sexta-feira, 5 de outubro de 2007

O DIA - CRIANÇAS DE 6 A 10 ANOS IMITAM CENAS VIOLENTAS E ABREM POLÊMICA.

O DIA ON LINE.

5/10/2007 02:07:00 h.

Crianças de 6 a 10 anos imitam cenas violentas e abrem polêmica.

Flávia Salme

Rio - Professores estão divididos com a nova moda nas escolas entre crianças de 6 a 10 anos: brincar de ‘Tropa de Elite’, filme sobre o Bope (Batalhão de Operações Especiais da PM). Eles cantam música entoada pelos atores que fala em “deitar corpo no chão”. E imitam cenas de violência do Capitão Nascimento, papel de Wagner Moura, conforme revelou ontem o ‘Informe do DIA’.

Em turma de 20 alunos do 5ª ano do Colégio Pedro II (CPII) de São Cristóvão, apenas seis não assistiram à cópia pirata. “Moro no Complexo da Maré e vejo como os policiais fazem. Os PMs já invadiram minha casa e reviraram a bolsa da minha mãe. Depois foram embora e deixaram tudo bagunçado, foi horrível. O filme mostra como eles (policiais) fazem isso, eu gostei”, conta a estudante K., 10 anos. “Minha mãe não queria deixar eu ver, mas falei ‘já fui assaltado com pistola e consegui salvar meu celular. Se sou esperto para andar sozinho, posso ver o filme’, aí ela deixou. Não gostei das cenas em que os PMs colocam o saco na cabeça das pessoas”, contou M. Todos viram o DVD através dos pais. P., 11, disse que sua família permitiu mas ela não quis ver: “O Bope protege, mas é muito violento. É horrível”.

“Fiquei assustada quando, voltando de excursão, vi o ônibus inteiro cantando a música do Bope. Não é tema para eles”, defende a professora Marluce Souza, 38 anos, do Colégio Pedro II. Já sua colega, a professora Alice de Castro Ribeiro Ferreira, 41, pôs os filhos de 10 e 13 anos para ver o filme: “Foi uma boa oportunidade de mostrar a eles o que é certo e o que é errado. Discutimos como os mesmos jovens da classe média que financiam a droga vão para a rua pedir paz sem perceber que eles são agentes da violência”.

ARMAS DE BRINQUEDO

“Não podemos interferir na educação que os pais querem dar para os filhos, mas fazemos nossa parte. Às vezes eles brincam de cantar a música do Bope ou de imitar cenas do filme. Cortamos logo. Escola não é lugar de violência nem de reprodução de seus modelos", explica a diretora de Ensino Fundamental do Colégio Pedro II de São Cristóvão, Ana Lúcia Senos Mello, 41.

No colégio ADN Júnior, no Méier, o orientador educacional e pedagógico Paulo Celso Peres, 51, se reunirá com os pais segunda-feira para debater a questão: “Mãe de aluno me procurou pois o filho quis pedir autógrafo a policial do Bope durante operação no local onde moram. As crianças precisam de orientação para diferenciar ficção de realidade”.

Pais e professores de escolas e creches dos morros da Babilônia e Chapéu Mangueira também se reuniram para discutir o mesmo problema. “Cerca de 30 crianças em cada comunidade começaram a vivenciar o roteiro. Fizeram armas de madeira. Um grupo era o Bope e o outro, os que sofriam a repressão. Imitavam os gritos do Wagner Moura”, contou o presidente da Associação de Moradores do Morro da Babilônia, Isaías Ferreira, ressaltando que não houve agressão entre elas.

DEBATE: VIOLÊNCIA MOSTRADA PARA OS FILHOS

CONTRA

“É insanidade dos pais permitir que filhos pequenos assistam a filme de violência. Eles estão em fase de formação e acharão que a forma de se relacionar com o outro é via pancada. É o modelo que ela passa a ter. Quem deixa o filho ver um filme desses não está nem aí para a formação da criança. Os pais costumam falar: ‘meus filhos não têm limites’. Limites começam a ser impostos em casa. Querem estabelecê-los quando chega a adolescência, como no caso da agressão à empregada. Mas a formação começa cedo”.

MARCOS RIBEIRO, consultor do Ministério da Educação

A FAVOR.


“Os pais não têm como controlar. Se o filho não assistir ao filme saberá na rua, na novela. Se crianças são capazes de reproduzir modelos, podem discutir qualquer assunto. Impedi-las de ver o filme não significa protegê-las da violência. Tem muita criança que convive com o caveirão, dorme e acorda em meio a tiroteios. Esconder isso não ajuda em nada. O papel dos pais e educadores é fundamental. Mas o diálogo tem que ser franco.”

PEDRO PAULO BICALHO, doutor em Psicologia e professor de Criminologia do Instituto de Psicologia da UFRJ.

NOVO FILME SERÁ SOBRE POLÍTICA

Depois do ‘boom’ alcançado com ‘Tropa de Elite’, o diretor José Padilha aproveitou que os refletores estão virados para ele e anunciou que o seu próximo filme será sobre o Congresso Nacional. “Ainda estou estudando o assunto, mas será sobre as escolhas que um político faz para chegar à Presidência do Congresso”, contou ele, que fará o longa-metragem em parceria com o cantor Gabriel O Pensador.

Enquanto o próximo filme não é rodado, os fãs se organizam hoje — data oficial de estréia — para protestar contra a não-indicação de ‘Tropa de Elite’ como candidato do Brasil ao Oscar. Ele perdeu para ‘O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias’, de Cao Hamburger.
Estudante de Veterinária, Luciane Ribeiro, 25 anos, é uma das organizadoras da manifestação. Com o auxílio do Orkut, usuários de todo o País foram descobrindo o movimento e a estudante chegou a encomendar 300 camisetas com os dizeres ‘Bota o Oscar no saco’.

Vinte desses fãs estarão em um cinema da Barra da Tijuca hoje. “Nossa idéia é chegar cantando as marchas do filme, vestidos de calça preta e com a camiseta do protesto”, conta Luciane, ansiosa para assistir ao longa pela 11ª vez, porém a primeira na telona.

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